Um brasileiro que fala um alemão macarrônico chega a Frankfurt sem saber nem mesmo onde vai morar... Aqui narro minhas aventuras nesta temporada germânica: lugares interessantes, enrascadas em que me meto, esquisitices que percebo a cada dia. O nome do blog é uma analogia aos irmãos Grimm, alemães que compilaram muitas dezenas de contos de fada tradicionais, como Branca de Neve, João e Maria, Rapunzel, a Gata Borralheira, o Músico Maravilhoso, Chapeuzinho Vermelho, e a Bela Adormecida (mais detalhes em Vorstellung).

Centenas de fotos disponíveis em Ilustrações.


sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Kapitel CXIV – Trilogia: A Fraternidade da Alemanha

Já estou sendo cobrado pelo meu sumiço, pela minha recende falta de produtividade nestes Contos Fantásticos. É que tive duas semanas agitadas, com pouco tempo livre. Mas contarei o que me aconteceu nos neste Kapitel e nos dois seguintes, que formarão uma “trilogia”. Estava se aproximando minha viagem para Bruxelas, onde eu participaria de um curso de verão sobre partidos políticos. Mas antes eu ainda tinha alguns compromissos na Alemanha.


Primeiro, fui ao Jazzkeller, onde seriam comemorados o aniversário de Celi (a paulista da viagem para Freiburg; ver o Kapitel anterior) e a despedida de Alécio (outro brasileiro do grupo da festa da casa do Filipe; sobre esta, ver Kapitel LVII), que voltaria para o Brasil. Estava lá a maioria dos brasileiros que conheci na Alemanha: Vítor, Filipe, Gilberto, Letice, Fiorina, Celi, Ulisses, Alécio. O som era um jazzinho muito bom, que lembrava a ótima trilha sonora dos Peanuts composta por Vince Guaraldi. Dei um tempo nas cervejas e lá bebi o vinho Côtes du Rhône. Foi também a minha despedida europeia do meu camarada Vítor, que voltou ao Brasil enquanto eu estava na Bélgica.

No dia seguinte, foi a vez de me encontrar com Berenice, que não via já fazia um tempão. Fomos a um restaurante no bairro de Sachsenhausen, chamado Frollein. A ideia era bebermos Apfelwein, o tradicional vinho de maçã frankfurtiano, mas fomos surpreendidos pela informação de que eles não tinham. Fui obrigado a voltar à cerveja (fazer o quê, né?). Bebi uma cerveja escura chamada Hövels, e comi Käsekreiner, que é uma salsicha recheada com queijo.

Antes de me encontrar com Berê no restaurante, no entanto, consegui a proeza de ter dificuldades de encontrá-lo. Atravessei a ponte no rio Main, adentrei Sachsenhausen, e estive do outro lado da rua em frente ao restaurante mas não o reconheci; virei, então, à direita, e dei a maior volta, até retornar pelo outro lado da rua e, após muito caminhar, deparar-me com o Frollein e me dar conta de que eu tinha me enrolado à toa.

Um dia depois, foi a vez de ir pela última vez a Mainz (ou Mogúncia), encontrar-me com Tobi e Marion Mannhold. Cheguei mais cedo, enquanto eles ainda estavam no trabalho, para visitar o Museu Gutenberg. Como disse no Kapitel XLIII, Gutenberg está para Mogúncia como Goethe está para Frankfurt. Como grande personagem histórico nascido na cidade, tudo lá leva o seu nome.

O Museu Gutenberg mostra antigas máquinas de impressão, conta sobre a vida do criador da imprensa móvel, exibe vários impressos europeus e chineses e, claro, a famosa Bíblia de Gutenberg. O frustrante é que o museu fechou mais cedo do que o divulgado no site, por estar em período de férias, de modo que fui, basicamente, expulso de lá antes de terminar de ver as últimas salas.

Precisei, também, fazer uma horinha antes de encontrar meus amigos. Quando Marion e Tobias apareceram, fomos a uma tradicional casa de vinho da cidade. Lá, bebemos Feder Weisser, um tipo de vinho branco mais suave, que é o vinho ainda “jovem”, no começo do processo de fermentação. Como Mogúncia é uma cidade produtora de vinho, eles vendem apenas nos meses de setembro e outubro, em função da época da colheita das uvas, essa bebida. Achei saborosa, apesar de bem diferente do vinho em seu estágio final.

As leveduras ficam concentradas no fundo do copo, e eles me alertaram para não ingeri-las, pois elas continuariam trabalhando dentro do meu estômago, podendo dar um... digamos... revertério. Eu parecia um perito em beber Feder Weisser: deixei menos de um milímetro de líquido acima da levedura. Marion era claramente a mais medrosa; temendo ingerir o pozinho do fundo, deixou quase um quarto do líquido. Tobi, que talvez tenha bebido com um pouco da levedura junto, ainda arrematou o restinho do líquido da taça da Marion. Marion comentou que as conseqüências eles veriam à noite. Espero que não tenha havido nenhuma...

Tobi tentou pedir para nós o tradicional acompanha- mento para o Feder Weisser: uma torta de cebola chamada Zwiebel- kuchen. Ele brincou que tal iguaria, junto com o Feder Weisser, dá um efeito bombástico, com as leveduras continuando a trabalhar dentro da barriga ainda mais ativamente, mas ainda assim todo mundo consome os dois juntos. Infelizmente (ou não) o produto estava no cardápio mas o bar não tinha.

Depois, fomos comer em um restaurante que funciona em um antigo prédio onde originalmente era um hospital. Bem interessante o lugar. Só que no cardápio todos os pratos vinham com batata (sobre essa leguminosa nos restaurantes germânicos, ver Kapitel XVII). Acabei comendo um pão no forno coberto com molho e queijos, que parecia uma pizza; estava bom e era o único jeito de fugir das batatas, essa obsessão gastronômica dos alemães. Voltei a beber a cerveja Hövels, a mesma de quando fui ao restaurante com a Berê em Frankfurt, e depois encerramos a noite com o licor Jägermeister, o mesmo que tínhamos bebido na vez anterior que os visitei em Mainz (ver Kapitel LXII). Foi curiosa a cara de espanto da garçonete quando Tobi pediu a bebida. Depois, ele comentou isso com outro garçom, perguntando se é incomum consumirem o licor, e este fez graça, respondendo que é porque ela queria que fosse ela a beber no nosso lugar.

Foi muito bom reencontrar esse casal de amigos. Como são muito ocupados e vivem em outra cidade, não sei se voltarei a vê-los nesta temporada europeia, que já está acabando. Espero que sim. De todo modo, sempre muito gentis, eles me deram lembranças de Mainz: um calendário com fotos da cidade, e um copinho desenhado com uma cena de Mogúncia para beber Jägermeister ou outra bebida.

Ainda faltavam poucos dias para viajar para Bruxelas, mas o fato de eu não sair mais de casa até lá não significava que eu estaria de bobeira. Foi uma grande correria, porque eu precisava terminar o artigo para um congresso de ciências sociais no Brasil antes de partir. Seria um inferno precisar escrevê-lo no meio do curso de verão, e o prazo final para enviá-lo era bem no meio do período em que eu estaria na Bélgica.

Para vocês terem uma ideia de como foi corrido, acabei exatamente no mesmo dia do meu voo. Saí correndo, com medo de me atrasar, e dormi pouquíssimo naquela noite. Aliás, isso bem poderia ser um presságio do que me ocorreria nas duas semanas seguintes.

Nenhum comentário:

Postar um comentário