Um brasileiro que fala um alemão macarrônico chega a Frankfurt sem saber nem mesmo onde vai morar... Aqui narro minhas aventuras nesta temporada germânica: lugares interessantes, enrascadas em que me meto, esquisitices que percebo a cada dia. O nome do blog é uma analogia aos irmãos Grimm, alemães que compilaram muitas dezenas de contos de fada tradicionais, como Branca de Neve, João e Maria, Rapunzel, a Gata Borralheira, o Músico Maravilhoso, Chapeuzinho Vermelho, e a Bela Adormecida (mais detalhes em Vorstellung).

Centenas de fotos disponíveis em Ilustrações.


segunda-feira, 31 de maio de 2010

Kapitel LXI – O Lodo

A situação em minha dispensa já estava deprimente. Haviam acabado a água mineral, o pão, o café, o queijo, os frios, a cerveja, o suco de maçã... Enfim, eu precisava desesperadamente fazer compras. Então, enchi meu mochilão de garrafas vazias para trocar e peguei o metrô.

A ideia era aproveitar esta saída para almoçar na rua. A vontade de comer em algum dos restaurantes de sempre era nenhuma. Então, eu me lembrei de que na Hauptwache, a estação onde há mais conexões para trens de curta distância (os S-Bahn), há um verdadeiro mundo subterrâneo: mercado, drogaria, bar, restaurantes, fast-food, loja de flores, padaria... Portanto, lá eu haveria de encontrar um lugar para almoçar.

Segui, então, algumas estações a mais, em vez de saltar na Holzhausenstraße, que está próxima do supermercado, fui até a Hauptwache. Logo vi um restaurante que me chamou a atenção: New Dehli. Ora, ainda não tinha comido em restaurante indiano desde que cheguei a Frankfurt. E lá fui eu experimentar algum prato exótico.

Havia um chamado palak paneer, que era feito à base de espinafre e levava um tipo de queijo. Pedi e, quando a moça começou a servir, bateu aquele leve arrependimento. O prato era horroroso! Parecia um lodo, um musgo, uma lama, sei lá. Aliás, todos os pratos eram feios de doer. Mas eu estava lá, já tinha pedido, e precisava ser corajoso naquele momento.

Comecei a comer. O arroz não era lá essas coisas, mas até que o lodo, digo, o palak paneer era bonzinho. Não era o melhor prato que já comi na minha vida, é verdade, mas era suficientemente bom para eu voltar a comê-lo algum dia. E ficava ainda melhor depois de se adicionar a ele uma boa pimentinha. Até que valeu a pena o risco.

Com a boca fumegando, eu estava pronto para minhas compras de mercado. Foram as maiores que fiz até agora. Meu mochilão voltou para casa surrealmente pesado. O destaque vai para o ótimo café gelado Müller Typ Kaffee, que tinha experimentado da outra vez e adorei. E o que era o melhor: havia conjuntos de três garrafinhas em uma prateleira com a inscrição “Aktionpreis”! Sim, isso significa PROMOÇÃO! Nada melhor para um viciado do que ver a fonte de seu vício estar acessível e barata. Três pelo preço de duas. Trouxe nove! Imaginem o peso de minha mochila se fossem cinco pelo preço de três...

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Kapitel LX – Como uma Máquina do Tempo

Hoje foi um dia chuvoso e sem graça, em que eu ficaria em casa estudando e só. Bem, a ideia era estudar sim, mas o “e só” me incomodava. Então, resolvi fazer algo em que eu estava pensando desde a última vez em que estive no Römerberg, a histórica praça central de Frankfurt. Daquela vez, passei em frente ao Museu Histórico, localizado ali ao lado, e pensei: “poxa, tenho que entrar nele qualquer dia”. O museu chama atenção porque, em frente a ele, há uma estátua de Carlos Magno, ao lado da qual já posei para foto uma vez, coisa que um alemão dificilmente faria.

Pois resolvi que hoje era um bom dia para conhecer o museu. Aproveitei e convidei Manfred para ir. Ele começou com seu tradicional pão-durismo, mas, quando viu que a entrada era baratinha, resolveu aceitar. Antes ele queria renovar uma tal carteirinha-mamata que dá descontos em vários centros culturais. Fomos até o lugar, que é ao lado do antigo trabalho de Manfred, onde Mario trabalha. Até subimos para fazer uma visita.

No lugar onde se faz a carteirinha, há também uma loja sem fins lucrativos que vende brinquedos usados a preço baixo para quem não pode comprar presentes novos para os filhos. Muito baixo mesmo! Havia bonequinhos de pelúcia por 20 e 30 cêntimos. Manfred até brincou que o de trinta cêntimos devia ser de muito melhor qualidade que o de vinte.

De qualquer forma, a viagem foi em vão. A máquina para fazer a carteirinha não estava lá. Manfred tinha duas opções: preencher um formulário e esperar duzentos anos até o documento ficar pronto, ou ir a outro lugar, onde estava a máquina, para fazê-lo. Duas opções que ele logo descartou, e fomos ao museu assim mesmo.

Lá, aceitaram tanto a carteira velha dele como minha carteirinha brasileira de estudante, sem problemas. Foram apenas dois euros para cada, para visitar um museu bastante interessante, onde permanecemos um bom tempo. Trata-se de um museu particularmente voltado para a história da cidade. No primeiro andar há moedas antigas, e pinturas e esculturas de séculos passados, especialmente o XV e o XVI. A maioria delas tem motivos religiosos, claro, e sempre que o artista é frankfurtiano isso é destacado.

No andar de cima, objetos e textos sobre a história da cidade, originalmente livre e, depois, parte da Prússia. Muita informação sobre o histórico de aceitação de estrangeiros, especialmente protestantes perseguidos pela Igreja Católica em outros países europeus. É claro que esse histórico foi rompido com a ascensão dos nazistas, contrastando com a confortável situação social e política que os judeus viviam pouco tempo antes, na República de Weimar.

Aliás, apesar de até determinada época os judeus terem que viver em guetos na cidade, depois disso houve um longo período de aceitação até o mais recente e famoso retrocesso. De 1800 a 1900 a população de Frankfurt se multiplicou por dez, e os judeus, que eram cerca de um décimo dos habitantes, aumentaram na mesma proporção. Era, proporcionalmente, a maior população judia da Alemanha. Outra vítima dos nazistas bastante destacada foi a comunidade cigana. Além disso, nem sempre a vida dos estrangeiros foi tranqüila antes do nazismo, e se mencionavam as condições precárias de habitação dos trabalhadores vindos do sul da Europa.

Havia no museu a reprodução de diferentes mapas da cidade, mostrando como Frankfurt cresceu, inclusive incorporando regiões próximas. O lugar onde vivo, por exemplo, estava bem fora dos limites originais de Frankfurt. Passeando-se pela cidade podem-se ver algumas torres, que eram pontos de observação que demarcavam onde ficavam os antigos muros. Comprei a réplica de um desses mapas lá por dois euros e cinqüenta.

A última coisa que vimos foi uma interessante mostra temporária de fotografias tiradas pelos próprios soldados alemães na segunda guerra. Além do dia-a-dia das tropas, foi retratado tudo o que lhes chamou atenção nos países invadidos.

Os curadores observaram que àquela época eles estacam pouco habituados a sair do país, e variava como eles reagiam ao que viam: enquanto no Ocidente em geral adotavam uma postura de turistas, em outras partes destacavam o que lhes parecia exótico e inferior, como os russos, a população do norte da África e os soldados negros que lutaram pela França.

Duas fotos me impressionaram particularmente: em uma, os invasores alemães debochavam dos poloneses diante de mulheres polacas que olhavam para eles com cara de zangadas; em outra, uma pessoa local atravessa um rio para que o exército alemão se certifique de que não há minas ali. A Guerra é uma coisa nojenta!

Antes disso, vi uma série de objetos das mais variadas épocas, mostrando fatos históricos e hábitos do dia-a-dia. Algo que não se vê em outros museus são pinturas simpáticas ao nazismo. Mais bizarro foi ver que foram publicados livros infantis com apologia ao regime, e até uma árvore de natal com suásticas em vez de bolas havia lá.

Entre os cartazes, havia de tudo um pouco: propaganda nazista, comercial da Lufthansa, anúncio de eventos musicais dos anos quarenta, protesto de esquerda contra a grande coalizão dos social-democratas com os democrata-cristãos após a Segunda Guerra. Roupas, louças, e até banheiros de outras épocas marcavam presença, juntamente com a réplica de uma coroa de Carlos Magno e uma camisa do Eintracht Frankfurt, usada pelo ganês Yeboah. Nela, no lugar da propaganda, havia os dizeres: “meu amigo é estrangeiro”. Um recado importante nessas idas e vindas desta cidade cosmopolita.

Outras fotos que tirei do museu estão acessíveis neste link.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Kapitel LIX – Entre Piratas, Dragões e... uma Donzela Indefesa?

Esta segunda-feira foi feriado aqui na Alemanha. E o dia estava ainda mais quente do que ontem! Parece que aqui em Frankfurt fica a maior piscina pública da Europa. Não foi para lá que eu fui, mas aproveitei o calor para não apenas sair mais uma vez de bermuda como – vejam quanta ousadia! – calçar sandálias. E foi desse modo que fui conhecer a casa do Jens, no bairro de Westend, e seu filhinho, Leon.

Eu e Jens almoçamos em um restaurante grego, com mesas dispostas em um jardim já preparado para a Copa do Mundo, com um grande telão e bandeirinhas dos países participantes. Comemos costeletas de cordeiro e bebemos cerveja Skt. Martinus Pilsner, produzida por uma pequena cervejaria, a Martinsbräu. Jens explicou que a palavra “Bräu” tem trema no dialeto bávaro e no sul da Alemanha, de modo que isso já indica a procedência da cerveja; uma cervejaria do norte teria o nome “Brau”, nunca “Bräu”.

Leon, o filho de Jens, não foi conosco. Comeu em casa. É um menino muito sorridente, que adora visitas. Gosta de bolas, dragões e piratas, não necessariamente nesta ordem. Ele tem, provavelmente, a babá mais forte e esportiva do mundo. Jens contou que ela foi da equipe nacional de judô, e com ela disputava competições internacionais. Teve que abandonar a arte marcial japonesa por causa de uma contusão.

Tempos depois, apaixonou-se por um jogador de futebol americano das Ilhas Maurício (?!), com quem, inclusive, vai se casar em breve. E não é que ela também acabou jogando futebol americano? E faz parte da seleção alemã feminina de futebol americano (?!!!). Eu não imaginava que havia futebol americano feminino de verdade (sei que no Superbowl existem umas preliminares de lingerie, mas não algo para se levar a sério). Também não me parece que seja, propriamente, um esporte muito leve para alguém que precisou abandonar o judô por causa de uma contusão. Mas ela não só joga como disputará em breve o campeonato europeu de futebol americano (?!!!!!).

Apesar de sua queda por esportes brutos, ela é muito delicada com Leon. Assim, a preferência dele deve ir para a bola, na disputa com piratas e dragões. Mas será que vai para a bola oval? Não se depender do pai, torcedor de futebol do Hannover 96.

domingo, 23 de maio de 2010

Kapitel LVIII – O Sol, a Casa, o Peru e Muitas Voltas

Hoje o sol apareceu de verdade! É claramente o dia mais quente desde que pus os pés em Frankfurt. Tanto que, neste momento em que escrevo, estou usando bermudas! Sim, bermudas! Curtas! Desde que cheguei sempre usei calça comprida.

Dia ensolarado é dia de se sair para a rua. Pelo menos na Europa, é, afinal, aqui sol quente não é uma banalidade de quase todos os dias como no Rio de Janeiro. E lá fui eu, cerca de três ou quatro da tarde, explorar áreas do meu bairro ainda pouco conhecidas por mim e arranjar um lugar para almoçar.

Como hoje eu pretendia viajar para alguma cidadezinha próxima mas meu fim-de-semana boêmio inviabilizou a programação turística, resolvi fazer algo intermediário entre isso e ficar em casa. Explico: Anne Frank, a judia que se celebrizou por, bem jovem, relatar em seu diário os horrores do Holocausto e cujos escritos se tornaram postumamente um best-seller, era frankfurtiana. Ela nasceu e morou em Frankfurt, até seus pais resolverem se mudar para a Holanda quando o Partido Nacional-Socialista subiu ao poder. E adivinhem em que bairro ela morava: Dornbush! O mesmo que eu. Então, meu plano era visitar suas duas antigas casas e comer no restaurante mais interessante que encontrasse pelo caminho.

Pesquisei no Google Mapas onde ficavam os endereços das duas casas e como eu deveria fazer para chegar lá. A mais próxima era muito simples de se ir, fica na rua Marbachweg 307.
A outra, na Ganghoferstraße 24, não era tão fácil, mas anotei num papel todas as possibilidades de percurso, de modo que não haveria de ter problema... E lá fui eu.

Logo encontrei a primeira casa, bem simples, e tirei fotos. Em um dia em que vi vários restaurantes fechados, havia uma pizzaria aberta exatamente em frente à antiga casa da família Frank. A Pizzeria Dick & Doof também servia massas, Schnitzel, saladas, frutos do mar e outros pratos. Pedi algo que eu ainda não tinha visto aqui na Alemanha: estrogonofe. No caso, estrogonofe de peru, chamado Geschnetzeltes Stroganoff. Não, esse palavrão “Geschnetzeltes” não significa peru, e sim “fatiado”. Sabia que era carne de peru porque, na explicação, dizia “Putengeschnetzeites”, e tudo o que começa com “Puten” é de peru. Ler cardápios em alemão é uma arte, não é mesmo?

Comi meu estrogonofe e parti para a outra casa, que ficava mais perto de outra estação de metrô, a Hügelstraße. Caminhei até lá e fui para o lado que achava que era o certo. Não era. Dei uma enorme volta, passei por lugares onde já tinha estado antes com Manfred mas aonde não saberia chegar sozinho (como a central mais próxima dos correios, por exemplo, onde há umas estátuas engraçadas na entrada), pedi informações.

A essa altura eu só queria voltar para a esquina da Eschersheimer Landstraße (a minha rua, que é por onde passa o metrô na superfície) e a Hügelstraße, para, então, tentar me reorientar. Chegando lá, enfim, pus a mão no bolso para ver minhas anotações de como chegar na tal da Ganghoferstraße. E quem disse que encontrei? Estúpido, perdi o papel!

De memória já estava evidente que eu não saberia como chegar. Atravessei a rua e fui até o ponto de ônibus, onde havia um grande mapa sinalizando onde eu estava. Mas nem com mapa encontrei o raio da ruazinha! Desisti. Outro dia pesquiso novamente no Google, anoto num papel, não o perco e, aí, conheço a segunda casa de Anne Frank.

Para voltar, fui até a estação de metrô e, coincidentemente, encontrei o Julian, o alemão que mencionei no Kapitel anterior. Ele até brincou, perguntando se eu só estava saindo da festa àquela hora. Afinal, aquela era justamente a estação de metrô mais próxima da casa do Filipe, onde o pessoal se encontrou na noite de ontem para hoje.

Enfim, valeu a pena o passeio. Mas bem que, na próxima encarnação, se isso existir, eu poderia vir com GPS, não é?

Kapitel LVII – Diálogos da Cigana

Mais uma vez cheguei em casa com o dia já claro. Eram umas 5h20 quando voltei do open-house do Filipe e da Fiorina, que aconteceu neste sábado. Eu assisti pelo Skype, com o necessário apoio logístico da minha mãe, ao primeiro jogo da final do campeonato brasileiro de basquete – vencido por 88 a 84 pelo Mengão – e saí, vestido com minha camisa do Flamengo. Era para cada um levar sua bebida e eu peguei a Schlappeseppel Urbräu Dunkel e a Kostrißer Schwarzbier que eu tinha na geladeira (agora, só falta uma garrafinha de cerveja). Cheguei lá depois das onze.

A grande surpresa foi ver a maior concentração brasileira desde que cheguei à Europa. Quando contei, éramos dezessete brasileiros. Além de nós, havia quatro alemães, todos capazes de falar português, sendo casados com brasileiras ou ex-moradores do Brasil, como o Julian, que eu já havia conhecido outro dia e estudou na USP. O pessoal era todo muito legal, havia gente das mais variadas áreas – médico, físico, filósofo... – e regiões do Brasil.

Foi uma noite divertida, de muitas risadas e música brasileira no violão e no cavaquinho. Surgiram frases memoráveis, como “O Brasil é ruim, mas é bom; a Europa é boa, mas é ruim.” É difícil me lembrar de tudo o que foi dito, mas ficarei com uma pequena amostra, produto do momento em que uma das presentes resolveu começar a ler a mão dos demais. Na transcrição dos diálogos, ela será doravante denominada “CIGANA” e suas vítimas, digo, as pessoas de quem ela leu a mão serão chamadas de “CLIENTE”.

Diálogo 1:
CIGANA: Sua linha do amor não está desenvolvida, você tem que se entregar mais. E há pessoas que têm uma linha forte do altruísmo, da generosidade, que você não tem. Mas as mãos podem mentir.

Diálogo 2:
CLIENTE: Eu tenho a mão de alguém com muita fertilidade.
CIGANA: O que você faz para ter estes calos nas mãos?

Diálogo 3:
CLIENTE: A minha mão diz que vou morrer aos 40.
CIGANA: Quantos anos você tem?
CLIENTE: Trinta e nove e meio.

Eu pensava em fazer uma viagenzinha amanhã mas, pelo avanço da hora, acho melhor acordar mais tarde e resolver questões de estudo. Quem sabe quando eu acordar as linhas da minha mão não estarão mais favoráveis, não é? Mesmo que não digam a verdade...



Todas as fotos da festa estão on-line.

sábado, 22 de maio de 2010

Kapitel LVI – O Som da Balalaika e o Focinho da Vaca

Após a aula desta sexta-feira, conversei com duas alunas do curso sobre política e sociedade no Brasil. Ambas estão muito interessadas em assistir a documentários brasileiros, para que a turma não fique apenas com uma ideia abstrata da realidade do Brasil. Uma delas é uma venezuelana chamada Maryhen , que se mudou para Frankfurt aos 9 anos com os pais, ambos então doutorandos em Direito. Ela se sente muito à vontade na Alemanha, que vê com seu país, mas fica ofendida se dizem que ela é alemã e não venezuelana. É claro que ela sempre será venezuelana para os alemães e sempre será muito alemã aos olhos de seus compatriotas. Ela pretende ainda voltar a viver na América Latina. A outra aluna era Lucia, aquela que estuda português. Fui com ela, em seguida, para o café da universidade, onde demos prosseguimento às nossas aulas poliglotas das línguas de Camões e Goethe (ver Kapitel LI).

Depois, encontrei-me com Jens e fomos até um bar ao ar livre perto da Bockenheimer Warte, pertinho da universidade, aproveitando o bom tempo que já está fazendo novamente por aqui. Experimentei mais uma boa cerveja escura de trigo, chamada König Ludwig. De lá, voltei para casa e tive a grata surpresa de receber a segunda carta do banco. Será que acabou a novela das minhas cartas (ver Kapitel LIV)?

Ao checar meus imêious, vi que meu amigo Vítor estava me chamando para ir a um bar em Sacksenhausen chamado Balalaika. Nós nos encontramos, então, na estação de metrô de Hauptwache, fomos até a de Südbahnhof, e comemos ali perto um shawarma (sanduíche árabe de carne de cordeiro, parecido com o kebap turco e que eu já conhecia no Rio). Foi minha primeira refeição no dia inteiro desde o sanduíche do café-da-manhã, pois eu estava totalmente sem fome ontem ao longo do dia. Em seguida, fomos à Balalaika.

Era um bar meio à luz de velas, estilo pub, onde os próprios clientes levam seus violões, gaitas ou o que quer que seja e fazem um som lá para os demais presentes. É um clima bem legal. A própria dona é uma coroa estadunidense, negra, de volumoso cabelo pintado de castanho claro avermelhado, que é cantora há várias décadas. Muito engraçada, ela também toca seu violão no bar e dá uns esporros naqueles clientes que conversam enquanto ela canta. Quanto à iluminação ambiente, Filipe, que chegou um pouco depois com a mulher dele, Fiorina, disse que a dona do Balailaika contou que, uma vez, um parente dela foi conhecer o bar e perguntou se ela não estava pagando a conta de luz.

Quando chegamos, a maior parte do tempo um grupo de amigos ficou fazendo um som, cuja qualidade não estava agradando muito a todos os presentes. Tudo mudou quando meus camaradas Vítor e Filipe pegaram o violão e tocaram junto com uma cantora paulista conhecida deles, Juliana. Os três arrebentaram, tocando vários sambas, músicas populares brasileiras, bossas-novas e outros sucessos de nosso país. Os caras que tinham tocado antes rapidamente foram embora.

Além deles, é preciso destacar também o excelente pianista romeno com cara de indiano Marius, amigo da Juliana, um outro estadunidense negro com um tremendo vozeirão que também cantava muitíssimo bem, e uns espanhóis que tocavam canções muito divertidas. O tempo passou e cheguei em casa ligeiramente tarde... Fui novamente dormir às seis da manhã! Vejamos a que horas durmo hoje, pois haverá um open-house na casa do Filipe, agora que a Fiorina, chegou para morar com ele em Frankfurt.

É claro que só acordei hoje lá para uma e meia. E só fui ter fome depois das cinco. Em troca de e-mails com minha amiga mineirinha Bárbara, do Iuperj, ela contou que assistiu a um documentário que explicava que todas as partes da vaca que não tinham valor comercial iam para a salsicha. No momento em que disseram que entre essas partes estava o focinho, ela achou melhor mudar de canal. Pois adivinhem o que comi às cinco horas: focinho de vaca, é claro! Afinal, em minhas últimas compras de supermercado trouxe diferentes tipos de salsichas e me esqueci de comprar várias outras comidas, como narrei no Kapitel LV. E tinha comprado a mostarda mais forte que vi no mercado. Exagerei na dose, ardeu a boca toda! Terei que moderar na próxima vez que comer focinho, digo, salsicha.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Kapitel LV – Cama e Mesa

Está tudo errado! Uma temporada longe de casa que mal começou e já estou comendo besteira freqüentemente. Esse monte de embutidos que há aqui na Alemanha, definitivamente, fez mais minha cabeça do que a modinha supersaudável “bio” (ver Kapitel XX). Ontem, talvez, tenha sido o dia em que mais exagerei.

Para começar, resolvi, antes de sair para a aula de política comparada, preparar alguma coisa para comer, em vez de almoçar na rua. Para mim, preparar alguma coisa para comer significa esquentar alguma coisa pré-pronta. No caso, as salsichinhas brancas bávaras. Manfred me disse: “isso não me parece ser um almoço”. Eu respondi que já havia comido isso duas vezes como jantar (ambas descritas nos Kapitel VII e XLI) e que, se pode ser servido como janta, também pode como almoço. Ele retrucou: “Bem, isso também não me parece ser algo para o jantar.”

Comi assim mesmo. Na embalagem, que Manfred leu para mim, além das instruções de preparo, dizia-se que era para servir com mostarda doce, pretzel e cerveja de trigo. O pretzel (aqui, Bretzel) foi substituído pela última fatia de pão de forma da minha dispensa. Também me faltava a mostarda, mas ontem mesmo comprei uma no mercado para comer com as próximas salsichas. Quanto à cerveja, eu não tinha a de trigo, mas poderia substituí-la por qualquer uma das três garrafas que eu tinha na geladeira. Mas não o fiz, a responsabilidade falou mais alto: eu não apenas precisaria ir à aula em seguida como ainda teria que fazer uma apresentação sobre rational choice. Bebi água com gás mesmo.

Outro dia, vi em um vídeo na internet que essas salsichinhas brancas da Baviera não são cozidas (o que se confirmava nas instruções da embalagem): deve-se ferver a água e, então, tirar a panela do fogo e, só aí, colocar as salsichas, que devem ficar lá por 10 a 12 minutos. No vídeo dizia ainda, nojentamente, que os bávaros consideram um absurdo cortar a salsicha com a faca, e que sua técnica para comê-la é chupá-la até só sobrar a pele. Bem, não sei quanto a eles, mas definitivamente não sou homem de chupar salsicha. Prefiro continuar com a mais educada técnica de tirar com garfo e faca a salsichinha branca de dentro da pele.

Na aula, foi tudo bem na apresentação, apesar de que, diferentemente da teoria rational choice que apresentamos, nosso comportamento foi totalmente irracional. Eu teria que fazer a apresentação com um búlgaro descendente de gregos chamado Georgi. Combinamos há várias semanas que leríamos logo o texto e, em seguida, marcaríamos de nos encontrarmos para preparar a apresentação. Só que nós dois nos atrapalhamos, um não entrou em contato com o outro porque ambos demoramos muito para ler tudo, e preparamos a apresentação separadamente. Para ficar no jargão da ciência política de tradição racionalista, vivenciamos o “problema da ação coletiva”.

Na hora H, portanto, não tínhamos definido o que cada um deveria falar, e fomos no improviso. Um ia falando e, quando desse margem ou titubeasse, o outro tomava a frente e continuava. Deu tudo certo no final das contas. Depois da aula, conversei um pouco com Georgi, Jens e um grego gente-fina, e fui ao café, onde consegui acessar a internet wireless pelo meu laptop pela primeira vez na universidade. Até liguei para casa pelo Skype, para tirar onda. Tentei marcar com o Jens de, depois, sairmos para uma cerveja ali perto, mas nos desencontramos.

Aí, fui embora, mas tive uma ideia para não ir direto pra casa. Eu havia comprado a passagem de metrô que dura um mês inteiro, que fica muito menos cara do que pagar todas as vezes; então, não custa nada para mim fazer várias viagens curtas e me desviar do caminho direto para casa. Minha ideia foi ir ao Römerberg, um dos lugares mais bonitos aqui da cidade (ontem, um pouco menos, devido ao tempo feio). É lá onde fica a sede do governo municipal, o Römer, desde o século XV. Lá também vendem vários tipos de Würsten (lingüiças, salsichas e outros embutidos) com pão e mostarda. Eu queria experimentar um que sabia que eles tinham: a tradicional salsicha frankfurtiana. E foi esse o meu jantar. Almocei e jantei salsicha. Saudável, não? Sempre ouvi dizer que salsichas são um monte de porcaria cheio de conservante. Bem, isso meu exame de sangue vai dizer quando eu voltar para o Brasil.

Tomei ainda um sorvete de casquinha de café e voltei. Mal cheguei em casa e já me preparei para ir ao supermercado Rewe. Eu não tinha mais pão, nem queijo, nem frios, nem suco, nem pizza, nem Schnitzel... Ou seja, nada para comer. Só café, água mineral e cerveja. Isso alimenta ainda menos que salsicha! Peguei, então, meu mochilão, enchi de garrafas vazias para trocar, e parti. Lá, fiz minhas maiores compras até agora, mas acabei me esquecendo de pegar pizza e Schnitzel. Mas tudo bem, foram duas garrafas de suco de maçã, três de água mineral, queijos, pão, frios, manteiga, mostarda e... vários tipos de salsicha. Comprei a frankfurtiana (só que a do mercado era totalmente diferente da que comprei no Römerberg) e duas que ainda não conheço: a Wiener (vienense) e a Rostbratwürtschen de Nurenberg. Em algum momento de preguiça de sair para comer na rua, elas serão devidamente traçadas com a mostarda que eu comprei. Depois das compras, arrematei com a ótima cerveja tcheca Březňák, desta vez a clara “Original Böhmisch” (a preta eu bebi outro dia, conforme relatei no Kapitel XLVIII).

Bem, já falei da mesa; falta, portanto, falar da cama. Era inevitável. Mais cedo ou mais tarde isto aconteceria. Marquei o relógio para acordar às 7h45, pois teria aula de alemão hoje às 9 horas. Só que, sem querer, marquei para as 7h45 PM. Malditos despertadores programados no sistema anglo-saxão! Acabei acordando sozinho às 9h10, ou seja, com a aula já começando. Inicialmente, pensei em ir e assistir a metade da aula pelo menos. Mas o tempo de manhã passa rápido. Quando vi que há eram 10h15 e eu ainda nem havia trocado de roupa ou colocado a lente de contato... deixei para lá, não é? Uma aula de alemão a menos, em que eu sempre boio mesmo, não fará tanta diferença assim.

Escrito mais um Kapitel, vou ler agora o texto que falta para a aula de hoje sobre política e sociedade no Brasil. Ah... não sei se é por causa da salsicha, mas estou com uma irresistível vontade de me despedir de vocês com o bordão: “Scooby-doo, meu filho, onde está você?!”

terça-feira, 18 de maio de 2010

Kapitel LIV – As Cartas Voadoras

Hoje chegaram duas cartas para mim, uma do banco e outra da universidade confirmando algo que eu já sabia, que eu tinha sido aceito como membro associado do seu centro internacional de pós-graduação em ciências sociais. Você deve estar se perguntando: “E daí? Qual é a importância disso, se todo mundo recebe cartas de bancos o tempo todo e se a mensagem da universidade não trazia nenhuma surpresa?” Pois esclareço: com estas, são apenas três as cartas que recebi até agora, enquanto sei de pelo menos outras quatro que deixaram de me entregar e jamais chegarão. Estão voando por aí, talvez com algum pombo-correio.

Desde que cheguei a Frankfurt tenho um problema crônico com as correspondências. Na Alemanha, os apartamentos não têm número. Não entendo o porquê, não dá tanto trabalho assim usar números nos apartamentos, seria uma medida tão simples. Esse costume pouco inteligente não facilita em nada a segurança de que as cartas chegarão. O remetente apenas coloca o número do prédio, e aí o carteiro procura na caixa postal do edifício o nome do destinatário. E se o nome não estiver lá? Aí, a carta volta, como já ocorreu comigo com duas cartas do banco, uma da universidade e uma que minha mãe me enviou registrada do Brasil.

A solução para evitar que a carta volte caso o nome não esteja lá é acrescentar na carta “C/O” (ou “care of”, “aos cuidados de”) e o sobrenome que está lá na caixa postal do seu apartamento (no meu caso, o de Mario e o de Manfred). Tudo muito prático, não? Alguém pergunta o seu endereço, e aí você não apenas diz o CEP, a rua e o número do prédio, mas também faz a ressalva de que é preciso acrescentar essa informação. Caso contrário, o carteiro, não muito preocupado com o destino das cartas, concluirá que você não mora lá. Foi isso o que os correios responderam para a universidade.

E se você preenche algum formulário com o seu endereço em alguma repartição? Aí, não haverá um espaço para acrescentar o “C/O” ao endereço e, provavelmente, todas as cartas que lhe enviarem de lá voltarão sempre. Tudo muito prático e inteligente. Eficientíssimo! E se houver mais de um apartamento com diferentes pessoas com o mesmo sobrenome? Aí, não sei, creio que os carteiros precisarão discutir com seus analistas toda sua perplexidade com essa possibilidade inimaginável em seu sistema tããão organizado. Além disso, a atendente do meu banco (que, ironicamente, é o Postbank, o banco dos correios!) disse que a correspondência bancária tinha que ir para uma caixa postal com o meu nome, não poderia ser colocado o “C/O”.

Eu havia colado na caixa postal um adesivo com o meu nome, para receber a carta registrada da minha mãe, que continha umas fotos de que eu precisava. Provavelmente, o carteiro veio antes e, então, não entregou a carta. Minha mãe nunca foi avisada disso pelo correio, apenas por mim. Portanto, não sei se a carta que ela escreveu foi deportada para a Turquia, se foi usada pelo carteiro para limpar a bunda, se foi dada por ele para o seu filho desenhar em cima... não sei, só sei que os correios alemães já me irritaram demais.

Essa carta não chegou e, para completar, Manfred, julgando que não haveria mais nenhuma correspondência para mim, tirou o adesivo com o meu nome. E foi assim que deixei de receber também duas cartas do banco (uma com o meu cartão!) e a primeira da universidade. Agora, colei novamente um adesivo gigante, bem maior que o anterior, com o meu nome completo, e todos estão avisados de que preciso que ele continue lá. Chegaram as duas cartas de hoje. Torçamos para que cheguem as próximas também...

Mario sempre defende que esse sistema não é uma estupidez. Diz que era mentira da funcionária do banco que não se pode colocar o C/O, e afirmou que, com isso, todas as cartas chegariam. Não é bem assim. O problema dos correios vai além da incompreensível não utilização de números nos apartamentos. E o fato de eu não ter recebido as cartas não pode ser creditado a uma culpa minha por não ter dito para as pessoas acrescentarem o C/O e por não haver, no momento, o meu nome na caixa postal.

A verdade é que todo mundo – ou ao menos muita gente – já deixou de receber correspondência alguma vez. Aconteceu com o Jens, com o Manfred... Não quatro cartas em apenas um mês, como ocorreu comigo, é claro, mas sim alguma em algum momento. Isso não ocorre no Brasil. Sim, os correios brasileiros são muitíssimo melhores que os alemães. E no Brasil os apartamentos têm números. Pois é... há menos cartas voadoras no Brasil. Além disso, lá, os carteiros precisam gastar parte do seu salário comprando papel higiênico.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Kapitel LIII – Não Vai Dar Pé

Na sexta-feira, o João Guilherme me disse que a Alemanha fará no dia 3 de junho, contra a Bósnia-Herzegovina, sua última partida antes da Copa do Mundo. Adivinhem onde: em Frankfurt! Ótima notícia, não é mesmo? Seria. Fiquei empolgado e resolvi que, nesta segunda-feira, iria ao estádio do time local, o Eintracht, onde será realizada a partida, para comprar meu ingresso. Só que vi hoje na internet que já está quase tudo lotado. Os ingressos mais baratos que restaram custam a bagatela de 75 euros! Isso muda consideravelmente meus planos.

Para conhecer o estádio do Eintracht, portanto, só a partir da próxima temporada da Bundesliga, que começa em agosto, eu acho. Já tenho até a camisa vermelha e preta do time, que comprei por trinta euros. Quem sabe também não dou um pulo em Hamburgo para assistir a um jogo do St. Pauli, o time proletário local, de cor marrom, que acaba de voltar à primeira divisão? O negócio é fazer planos para depois de agosto, porque para junho, o orçamento não fecha. Tenho tempo para descobrir um bar legal e animado para assistir a este jogo...

domingo, 16 de maio de 2010

Kapitel LII – As Garrafas e a Escolha Difícil

Acabou minha água mineral. Eu estava tranqüilo, porque pretendia ir hoje ao supermercado Rewe. Eu achava que ele ficava aberto dia e noite, mas na volta da boate na manhã de sábado eu vi que estava enganado: funciona das 7h às 24h, e não ao longo de todas as 24 horas. Hoje eu descobri outra coisa desagradável: ele também não abre aos domingos. Caramba, o Zona Sul é careiro mas, pelo menos, abre todos os dias. O maior Rewe de Frankfurt não. E eu saí para almoçar com mochilão nas costas cheio de garrafas vazias, para trocar depois. Fiz papel de bobo e voltei com todas as garrafas.

É claro que o que restava da última garrafa de água mineral não deu nem para o começo. Fiquei com três opções: água da bica, café e cerveja. Tomei um copo de água da bica, que, dizem, é boa para beber. Estou heroicamente resistindo a pegar uma das duas garrafas de cerveja que tenho na geladeira, afinal, se está difícil de estudar totalmente sóbrio, imaginem com álcool. Ou seja, restou-me o café. Estou me entupindo de canecas de café. Não reparem, portanto, se eu publicar algum Kapitel às cinco da manhã.

Kapitel LI – Sexta-feira e o Troglodita

A última sexta-feira foi um dia de eu tentar treinar o meu mais que primário alemão. Na aula de alemão e no almoço no bandejão Mensa do campus de Westend, conversei nesse idioma, dentro do possível, com gente da Polônia, Hungria, Dinamarca, Finlândia, Itália... Depois da aula de política brasileira em que sou assistente do Jens, a aluna que estuda português, Lucia (pronúncia italiana “Lutia” veio falar comigo). Queria que eu a ajudasse no português, enquanto ela me auxiliava no alemão. Fomos, então, até a cafeteria universitária e lá tentamos um falar o idioma do outro, corrigindo-nos mutuamente, e recorrendo ao inglês e ao espanhol quando havia dificuldade de compreensão. Ou seja, quatro idiomas para duas pessoas! Mas até que funcionou.

Mais tarde, eu ia a uma boate chamada Cocoon com o pessoal do curso de alemão. Não sou muito chegado a boates, sempre preferi um barzinho ou coisa assim, mas sair de casa é preciso! O João Guilherme avisou para ir vestido de forma mais social, pois lá eles poderiam ser frescos e outro brasileiro, o Gabriel, já tinha sido barrado uma vez por estar com uma roupa menos alinhada. Resolvi, então, passar uma camisa social e... queimou o ferro! Puff! Com direito a cheiro de queimado e fumacinha. Seria a primeira vez que eu iria usá-lo. Virei a chave na temperatura máxima e ele queimou. Como fazem um ferro que não resiste à temperatura máxima em que ele mesmo é capaz de ser colocado? Restou-me usar uma camisa mais grossa, que, com o tempo, desamassa sozinha. Aliás, todas as roupas que usei até agora estão se desamassando sozinhas, daí eu nunca ter usado o ferro, mesmo estando há mais de um mês aqui. Preguiçoso, eu? Juro que minhas camisas se desamassam mesmo, não estou saindo de casa amarrotado não!

Nosso ponto de encontro foi o alojamento dos estudantes em Bockenheim. Havia lá uma legião de italianos e poucos representantes da Grécia, da Hungria, da França e, claro, do Brasil: além de mim, estavam lá João e Gabriel. A Cocoon ficava longe, a leste, e nem metrô para lá existe. Pegamos um ônibus e partimos. Posso afirmar que as boates alemãs não são, de modo algum, muito diferentes das boates do Brasil, salvo pelo fato de não haver muitos brasileiros e de estarem cheias de alemães dentro. Os quatro euros cobrados pela cerveja são um eficiente instrumento para esvaziar os bolsos dos freqüentadores ou para fazê-los moderarem no álcool. Quanto ao lugar, podemos dizer... assim... que é muito bem freqüentado. Digamos que muito mesmo. Aliás, preciso melhorar meu alemão urgentemente.

Cheguei em casa às seis. Apesar de ter bebido pouco, no dia seguinte estava arrasado. Para começar, acordei às três e meia! Tinha um bocado de coisa para estudar, mas com o dia curto e o corpo cansado, no sábado não rendi nada, naturalmente. Mesmo com seguidas canecas de café. E hoje meu ritmo não está muito melhor do que ontem. E o pior é que nem tenho a desculpa de estar lendo pouco por estar treinando alemão.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Kapitel L – As Bolas Verdes e o Guarda-chuva Azul em um Dia Especial

Após mais de uma semana, voltei nesta quarta-feira a almoçar no bandejão Mensa do campus de Bockenheim da universidade. Fui com o Bertram e lá ambos comemos carne de porco ao molho de vinho. É bem verdade que o gosto do vinho passou longe, mas estava bom. O grande problema do Mensa não costuma ser a carne, que geralmente é boa, mas os acompanhamentos. Para variar, as opções de acompanhamento não me motivavam nem um pouco. Já não agüento mais colocar no prato aquele macarrãozinho noodle, que é uma porcaria (ver Kapitel XXXII). Em tese, deveria ser um Spätzle, ótima massa típica da região, à base de ovo (ver Kapitel VII). Só que aquilo lá é tão Spätzle quanto as “comidas” que aparecem nas propagandas da tevê não são de isopor. Ele tem cara de Spätzle, mas o gosto e a textura... argh!

Outras opções são, como sempre, batata frita e batata não frita! Desta vez, a não frita estava diferente, era purê e não cozida. Mas odeio batatas, não faz a menor diferença. Aliás, isso me faz lembrar o dia em que minha amiga Joana, nos tempos de faculdade, ao saber de minha aversão a batatas, perguntou-me: “mas você não gosta nem de purê de batata?”. E eu respondi: “Jô, eu odeio batata de tudo que é jeito, como é que eu vou gostar de purê, que é o estado mais ‘batatal’ da batata?!”

Além dessas opções, havia umas bolinhas verdes, que pareciam umas trouxinhas de alface. Eu não sabia o que eram. Bertram me disse que o nome delas em alemão é Rosenkohl. Para eu entender como se escrevia, disse que começava com Rose, como a flor, e terminava com Kohl, como o sobrenome do ex-chanceler democrata-cristão Helmut Kohl. Comentamos que deveriam ser primos, o que não me deixou alternativa senão arrematar: “vai ver que todos da família Kohl são redondos... a diferença é que estes são verdes e o Helmut é cor-de-rosa.”

De qualquer forma, é sintomático que eu tenha escolhido algo que eu nem sabia o que era, só para evitar as demais opções que eu conhecia. Alguma coisa está errada, não é mesmo? E está errada na cabeça desse nutricionista do Mensa! A propósito, uma breve pesquisa na Wikipédia esclareceu que o Rosenkohl é a couve-de-bruxelas, que aliás também tem nome semelhante em inglês. Não sei o que os belgas têm, efetivamente, a ver com esse vegetal, mas foi ele que me salvou de ter que comer aqueles noodles horrorosos novamente.

Depois do almoço, voltamos para a universidade, onde eu estudei um pouco, enrolei bastante (hoje a preguiça estava terrível...), e aprendi como fazer as mensagens para o meu e-mail institucional da Universidade de Frankfurt serem encaminhados para o GMail.

Depois, fui comprar créditos para o meu celular. Onde? Na drogaria. Sim, eu também acho muito estranho, mas aqui as drogarias são assim, vendem de tudo um pouco. Os alemães fazem uma grande diferença entre as farmácias (Apotheke) e as drogarias (Drogerie). Enquanto as primeiras vendem todo tipo de remédios, inclusive os controlados e os de manipulação, as drogarias são um verdadeiro “bundalelê”: vendem pilhas, material de escritório, chocolate, roupa... e créditos e chips para celulares.

Aproveitei que estava lá e comprei... um guarda-chuva! Como eu contei no Kapitel XLIII, o que eu trouxe do Brasil estava todo desmantelado, parecendo a capa do Batman, desde a primeira chuva de vento que peguei em Frankfurt. Como vi guarda-chuvas à venda, achei que era uma boa oportunidade de me molhar menos nos próximos torós. Aqui na Alemanha os guarda-chuvas são bem mais coloridos que no Brasil. Sem opções pretas, comprei um azul marinho.

Pouco depois que voltei para casa, conversei no Skype com minha irmã. Doze de maio é um dia especial: é o seu aniversário! Depois, falei ainda com mamãe e com a Fátima. Agora, publico este Kapitel e me despeço, pois este dia de bolinhas verdes e guarda-chuva azul terminará com a transmissão de um jogo do rubro-negro que eu não posso perder!

terça-feira, 11 de maio de 2010

Kapitel XLIX – A Família Pato e os Músicos

Hoje é segunda-feira, ou seja, um dos dias da aula de alemão. Desta vez, resisti à tentação e não liguei o computador de manhã, o que permitiu que pela primeira vez eu não só fosse a pé para o campus de Westend da universidade como ainda chegasse adiantado. Sempre me distraio na internet e acabo tendo que pegar o metrô e ainda assim chegar alguns minutos depois da hora.

O belo e arborizado campus de Westend hoje tinha um pato, bem à vontade diante da queda-d'água. Comecei compulsivamente a tirar fotos do bicho de todos os ângulos. Afinal, desta vez eu não estava atrasado. Depois, a aula foi massacrante como sempre, eu me senti exausto e com as energias sugadas como de costume, mas até que ela foi, provavelmente, até agora, aquela em que eu mais entendi o que estava se passando.

Terminada a classe, minha intenção original era a de ir ao outro campus, Bockenheim. Mas queria ir antes à Hauptwache, principal estação de trens urbanos S-bahn, para comprar um bilhete que dá direito a circular o mês inteiro – sai bem menos caro do que comprar a cada dia. Chegando lá, olhei o relógio, e já era quase meio dia. Aí, pensei: “Para que ir a Bockenheim? Eu não teria aula, provavelmente nem veria o Jens, por que não ter uma segunda-feira diferente, então?”

Comprei um pão com lingüiça, uma lata de uma cerveja de Hamburgo chamada Holsten, e passeei pela Zeil, a principal rua comercial de Frankfurt. Ela sempre está cheia de músicos, o que acho bem interessante. Hoje, aproveitei e filmei um quarteto tocando animadamente, e um senhor girando a manivela de um realejo. Depois, peguei o mapa para ver algum parque onde eu ainda não tinha estado: seria lá que eu estudaria! O escolhido foi o Von Bethmann Park. E terminei meu dia fora de casa do mesmo modo como comecei: vendo patos! Havia uma família inteira no parque. Dois adultos – suponho que pai e mãe – e três filhinhos. Nunca imaginei que patos combinassem tanto com os estudos.
   
Meus vídeos de Frankfurt



domingo, 9 de maio de 2010

Kapitel XLVIII – Os Persas, o Siamês e a Boêmia

A internet voltou! Depois de quase revirar o computador pelo avesso, descobri que era apenas um problema de senha. Descobri isso com a ajuda de São Manfred, é claro. No dia em que caiu a conexão aqui de casa, tentei de várias maneiras reconectar. Em algumas delas, precisei digitar novamente a senha, e aí coloquei a senha errada. A que eu tinha anotada era a do antigo apartamento (sobre os antigos apartamentos, ver Kapitel II), muito parecida com a deste, só que um pouco mais longa. Até tinha tentado ligar para o Mario para perguntar se eu estava com a senha certa, mas, como sabem, ainda por cima estou sem crédito no celular. Perguntei para uma das minhas colegas de apartamento – a que tem falado comigo (ver Kapitel XLV) – se a senha estava certa, e ela, provavelmente por não ter necessitado digitar a senha nunca mais desde que se mudou para cá, respondeu equivocadamente que estava. Daí toda a confusão.

O importante é que agora tudo voltou ao normal. Passei, então, um bom tempo no computador. Aproveitei para publicar dois Kapitel que eu havia escrito, o XLVI e o XLVII, decidindo-me por manter em ambos o texto original, produzido quando eu ainda estava sem conexão à internet. Quando acabei tudo o que tinha para fazer, já passava muito das quatro horas e eu estava roxo de fome.

Resolvi explorar uma parte da cidade que ainda não conhecia, perto da minha casa mas para o lado aonde nunca vou. Saí sem mapa e a esmo, o que significa que depois demoraria algum tempo para encontrar o caminho de volta. A poucos quarteirões de distância fui surpreendido por uma manifestação pacífica, em forma de passeata, acompanhada de modo amistoso por vários policiais. O curioso da passeata é que era formada por iranianos contrários ao governo de Ahmadinejad. Seus cartazes – os que tinham inscrições em alemão ou inglês, pois em persa fica difícil entender – traziam palavras em favor do socialismo, chamando a embaixada persa de centro terrorista e exigindo a libertação de presos políticos. Entendi que houve gritos de ordem em favor do Curdistão também. Filmei uma parte da mobilização.

Depois de acompanhar um pouco a passeata, eu me desviei e encontrei um restaurante tailandês. O nome era Mr. Thai-Express, e logo entendi por quê. O foco do restaurante é o de vender para as pessoas levarem para casa (“zum Mitnehemen”, no termo alemão, em oposição ao “zum hier essen”, “para comer aqui”). O lugar era completamente fechado (nem uma janelinha aberta sequer) e o cozinheiro trabalhava ali, na frente dos clientes. Ou seja, era um desagradável cheiro de comida por todo lado, com aquele vapor impregnando todos os cabelos e casacos que havia pela frente. Pelo menos minhas apimentadas tiras de filé com curry tailandês e leite de coco estavam boas.

Saindo de lá ainda dei uma longa volta, inicialmente por curiosidade e, depois, em busca do caminho de casa. Passaram-se bem umas duas horas de passeio, no mínimo. Parte dele foi realizada margeando o principal cemitério da cidade, realmente grande. Vi também alguns parques que eu nem conhecia.

Cheguei em casa e liguei pelo Skype para o telefone da minha avó, na casa de quem estava toda a família reunida pelo dia das mães. Com a minha eu já havia conversado mais cedo. Faltava falar com minha “bimãe” (vovó) e com minha “vice-
mãe” (dinda). Depois, como minha água acabou, não tive outra opção senão a de abrir uma ótima cerveja preta tcheca, Březňák Schwarzbier, que comprei no supermercado. Foi um dia bastante internacional, do Irã à República Tcheca, passando pela Tailândia. Coisas de uma cidade cosmopolita.


Kapitel XLVII – Sempre Perdido na Antiga Cidade

Ainda sem internet, pus em prática a continuação do meu plano de viajar o máximo possível em meu tempo livre. O destino deste sábado era Marburg, uma cidade bem antiga mas que, longe de ter se tornado um museu ao ar livre, é uma cidade universitária. Como eu veria uma cidade apenas e estava cansado, acordei um pouco mais tarde e acabei comprando minha passagem apenas às 11h49 (definitivamente, não sou tão controlado assim com os horários, é que a hora está gravada no bilhete). Marburg é mais longe do que as cidades para onde fui no domingo anterior (ver Kapitel XLIII), de modo que se leva mais de uma hora para chegar.

Só fui pisar na estação principal de trem (Hauptbanhof) de Marburg quase ao meio-dia. Mas seria tempo de sobra – pensei –, afinal, é a única cidade que conhecerei hoje. Seria tempo de sobra se não fosse por um detalhe: além de ser antiga, charmosa e bonita, Marburg tem outra característica marcante, a de ser pessimamente sinalizada! Simplesmente não há sinalização na Hauptbanhof dizendo em que direção ir para chegar à Marktplatz (ou praça do mercado, a principal da cidade, onde fica a prefeitura) e ao centro antigo (Altstadt). No meio da cidade também não encontrei nenhuma sinalização da localização da Marktplatz, só vi uma do Altstadt (já quando voltava), e não é fácil ver uma placa indicando o sentido da Hauptbanhof.
A conseqüência da má sinalização é que gastei um bom tempo dando a volta ao mundo. É claro que não ajudou em nada minha estúpida decisão de não pedir informações quando ainda estava na estação. Além disso, minha experiência da viagem da semana anterior já tinha me deixado uma dica: quando não souber para onde ir ao sair de uma estação central de trem em uma cidade alemã, se houver uma rua chamada Banhofstraße, siga por ela, pois são grandes as chances de você chegar nos principais lugares. Mas eu não segui a dica, sabe-se lá por quê...

Passei por uma área bem verde e residencial, onde havia um rio com patos e pedalinho. Andei muito, até chegar finalmente ao centro antigo. Entrei em uma bela igreja gótica do século XIII, a Elizabethkirche
Ali perto, seguindo por uma ruela, cheguei a uma humilde capela de São Miguel (St. Michaels-Kapelle), a “Michelchen”, mais ou menos da mesma época. A entrada estava fechada, mas, em uma placa que vi pouco depois, explicava-se que a Elizabethkirche era freqüentada pela nobreza, enquanto que os peregrinos faziam suas orações na capela.
Do lado de fora da capela havia um cemitério, e dentro da igreja Elizabethkirche não faltavam nem sepulcros de antigos nobres, nem brasões nas pilastras. Entrei ainda na bonita Igreja Paroquia  (Pfarrkirche) St. Marien, presbiteriana, e vi no centro antigo muitas casas interessantes, em estilo tipicamente alemão. Merece destaque a fortaleza Festung Marburg, enorme, erguida entre 1550 e 1886, localizada no ponto mais alto da cidade.

Eu tinha saído de casa após comer apenas um sanduíche de café-da-manhã, e só fui almoçar lá quase às seis e meia. Nesse intervalo, tomei apenas dois sorvetes de casquinha. Aliás, as bolas de sorvete são mais generosas em Frankfurt do que em Marburg (e o preço é equivalente: geralmente cobram 80 cêntimos em Frankfurt e lá paguei 70 em uma sorveteria e 80 na outra). Minha ideia era, depois de almoçar, entrar em uma taverna no subsolo, que parecia interessante, para tomar uma cerveja. Mas como lá eles não serviam comida, pesquisei outro lugar para almoçar.

Acabei achando um restaurante onde pedi um Schnitzel 'Zigeuner Art' (sobre esse prato, ver o Kapitel XXX). Para beber, uma caneca de cerveja Krombacher. A garçonete perguntou “Kleine oder grosse?”, e eu respondi que queria a grande, é claro. Enquanto eu esperava, a temperatura caiu vertiginosamente, de modo que eu já estava tremendo. Minha intenção era comer do lado de fora, olhando a cara da cidade, mas não agüentei e entrei. O prato não chegou tão rápido e meus 500 ml de cerveja “evaporaram” antes de a comida ser servida. Quando chegou o Schnitzel, fui obrigado a pedir mais meio litro de cerveja. Desta vez, após consultar o cardápio, pedi a versão escura de trigo da Krombacher.

O Scnhtitzel estava ótimo e vinha muito bem servido. Aproveitei ainda para pedir sobremesa. Já havia comido na Alemanha salsichão, porco, chucrute, bebido cerveja... tirando as batatas (que não como), é claro, só faltava uma coisa estereotipicamente alemã: o Apfelstrudel, a torta de maçã. Pois pedi um de sobremesa. Vinha quente, acompanhado com sorvete de creme e um chantilly. O pedido da sobremesa foi motivado tanto por querer provar essa iguaria germânica em território alemão como pela intenção de cortar um pouco o álcool (um litro de cerveja forte não é pouca coisa).

Era, então, o momento de procurar o caminho de volta para casa. Como vocês sabem, esse freqüentemente é um problema para mim comparável ao de João e Maria no conto de fadas (felizmente, para mim, a bruxa só apareceu no Kapitel XXVI). E a situação piora muito com a sinalização de Marburg. E não venham culpar a cerveja, pois eu estava bem sóbrio. Se não estivesse, certamente teria sido impossível articular, em alemão, perguntas como “onde fica a estação de trem?” e “como vou à estação de trem?”.

Cada vez que seguia uma placa, andava muito até chegar a algum caminho que tinha uma bifurcação ou que fazia uma curva, claramente se desviando da indicação. Estava claro que não havia placas para guiar ao longo de todo o percurso. Eu andava, andava, e quando achava outra placa, ela indicava uma direção totalmente diferente, pois em algum momento eu escolhi o lado errado e não havia uma placa para evitar isso. Pedi várias vezes informações, mas não era fácil entender o que as pessoas diziam (mesmo perdido, sempre insisto em perguntar em alemão, e só falo em inglês se as pessoas sugerirem).

Eu temia estar perdido no meio do caminho com a noite já escura, mas ainda estava razoavelmente claro quando cheguei à estação, às nove e pouquinho. Vi que o ônibus para Frankfurt só passaria às 21h30. Aproveitei para ir ao banheiro... que estava trancado! Pensei, irritado: “claro, o que alguém pode querer fazer em um banheiro fora do horário comercial, não é mesmo?”. Os banheiros das estações de trem realmente parecem não gostar de mim (sobre a situação anterior, na estação de Mogúncia/Mainz, ver o Kapitel XLIII).

Como eu tinha tempo, decidi ir a algum bar próximo para desidratar meu joelho e beber alguma coisa (não alcoólica!). Fui a um restaurante de döner kebap, esvaziei a bexiga e fui ver o que tinham de bebida. Fiquei intrigado com uma bebida turca que eles vendiam, que levava iogurte, chamada ayram. Corajosamente, arrisquei mais uma vez. Precisava provar. Além do mais, era barata, mais até do que a água mineral. No copo se informava que o ayram é constituído de iogurte, água e sal. Não gostei não. Parece um iogurte azedo, só isso. Mas bebi. Quem sabe não cortava o álcool?

O transporte público na Alemanha é reconhecido, com justiça, por sua impressionante pontualidade. Mas não é infalível. O trem, que eu tinha que esperar meia hora para chegar, atrasou ainda outros onze minutos. Só cheguei em casa às onze. Tinha combinado de sair com Vítor e Filipe, mas não só cheguei tarde como não consegui falar com eles. Suspeito que estou sem crédito no celular (só suspeito, porque não consigo entender o recado). Não consegui sair à noite nem sexta, nem sábado. Estou sem celular e sem internet... está complicada a minha situação. Pelo menos, estou conseguindo colocar o pé na estrada, digo, na linha férrea.
 
 

Kapitel XLVI – A Máquina do Mal e o Adormecido

Sempre acreditei que os computadores são seres malignos com vontade própria. Aliás, melhor seria dizer “com vontades próprias”, no plural; afinal, eles são cheios de vontades. Pois o meu laptop, que andava calminho desde o meu segundo dia em Frankfurt (ver Kapitel IV), atacou novamente. Caiu a conexão aqui em casa na sexta-feira à noite, mas ela voltou. Todos aqui em casa conseguiram conectar, menos eu! A droga do meu computador diz que o sinal da internet está “excelente”, mas não consigo conectar. Já fiz de tudo, já fucei cada instrução do computador (dá a maior raiva quando ele recomenda a utilização da ajuda on-line), e nenhum resultado! Passou o sábado inteiro e a situação é a mesma.

Eu ia sair com o pessoal do curso de alemão nesta sexta-feira, havia combinado com o João Guilherme. Seria bom inclusive para esquecer um pouco o problema. Só que estava com uma tremenda dor de cabeça, que o meu computador obviamente não contribuía para melhorar. Resolvi, lá pelas dez e pouco, tirar um cochilo, pois acreditava que a dor era resultado do horário alternativo do meu sono na quarta-feira (ver Kapitel XLIV) e das poucas horas dormidas na quinta (sempre durmo meio tarde e preciso acordar mais cedo nos dias de alemão, segundas e sextas). Só que minha soneca superou minhas expectativas. Só fui acordar às três e meia da madrugada! Lá se foi minha saída. E sem internet para compensar.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Kapitel XLV – O Drama de um Mudo

Hoje fui à aula de alemão, em que sempre fico “boiando”. O nível é da turma mais avançado do que o meu e o professor é bastante desorganizado e pouco metódico. Dizem que ele é muito bom, mas está claro para mim que não para quem sabe pouco e precisa de mais do que uma revisão. Eu tentava entender o significado de umas seis preposições e, de repente, apareceram outras quinze! Assim, fica muito difícil.

Ao menos, hoje me sentei ao lado de um albanês gente-fina, Dritan, que me esclareceu algumas coisas. Dritan adora o futebol brasileiro, é claro, apesar de não conhecê-lo tão bem assim. Faz faculdade na Universidade de Frankfurt, acho que em Economia, e fez um intercâmbio na Inglaterra, onde aprendeu todo o inglês que sabe falar. Aparentemente, ele fala melhor em alemão do que em inglês, mas é com esse inglês que me explica o que não entendo.

Depois da aula de segunda-feira, conversei bastante com ele, mas hoje falei mais com outros alunos, e acabei almoçando com o italiano Lorenzo e mais um brasileiro, Gabriel. Ambos fazem intercâmbio de graduação em Direito na universidade. Gabriel é um cara legal, mas tem o grave defeito de ser são-paulino, daqueles que acham que o São Paulo não foi campeão brasileiro no ano passado porque foi roubado e que defendem que o Sport Recife é o campeão brasileiro de 1987. Fazer o quê, não é? Lorenzo, apesar de italiano, não liga para o calcio e prefere o rúgbi. A propósito, almoçamos no bandejão Mensa de Westend, novamente paguei como estudante, mais barato (ver Kapitel XLII), e comi frango pela primeira vez desde que cheguei aqui. Quem lê regularmente estes Contos, sabe que venho me entupindo de carne suína quase diariamente.

Depois do almoço, fui para o campus de Bockenheim, onde acontece a aula de política brasileira em que colaboro com o Jens. Nesta turma, há uma aluna que começou a estudar português há pouco tempo e quer que eu a ajude a praticar. Em troca, quer me ajudar no alemão. Vamos ver no que dá. De fato, não são tantas as oportunidades de treinar alemão, por incrível que pareça. Tirando pedidos que faço em restaurantes, bares, mercados e padarias, sobra pouco. Hoje até conversei consideravelmente em alemão com Lorenzo e Gabriel, mas isso nem sempre ocorre.

Eu achava que, por morar com três alemães, eu praticaria bastante, pois eles me ajudariam, corrigindo meus erros e me ensinando palavras. A história foi bem diferente. As duas alemãs que moram aqui pouco falam comigo. Não vão muito além de bom-dia e tchau. No início, uma nunca falava comigo – acho até que evitava me encontrar no corredor – e a outra parecia que poderia, futuramente, conversar um pouco mais. Pois elas inverteram os papéis: a que nunca falava já estabelece uma conversação mínima (sem sinais de que se aproximará mais) e a outra, que tinha dado indícios de poder vir a quebrar o gelo, já nem se despede mais de mim.

Resta um morador de meu apartamento, o sempre mencionado Manfred. Como eu já disse várias vezes aqui, ele é um ótimo sujeito. Mas a questão é que, como contei no Kapitel XIII, ele viveu por dezesseis anos em Los Angeles. Então, prefere conversar comigo em inglês, sem paciência para o meu alemão rudimentar.

Confesso um certo receio de voltar ao Brasil em outubro sabendo menos alemão do que quando cheguei. Isso depois de morar na cidade natal de Goethe! Sempre penso que tenho que estudar alemão em casa, mas até agora só fiz isso uma vez. Bem, ainda tenho cinco meses para soltar o verbo...

Kapitel XLIV – O Urubu e o Corujão

Quarta-feira teria sido mais um dia trivial, em que não fui à universidade, estudei em casa, almocei um sanduíche, esquentei um Schnitzel congelado para a janta, saí com Manfred para trocar um pacote de café (estou experimentando para ver qual é meu café preferido, mas, estupidamente, tinha comprado por engano a mesma marca que havia julgado ruim). Sim, teria sido mais um dia trivial se não fosse pelo fato de que o Flamengo enfrentaria o Corinthians em um jogo decisivo pela Taça Libertadores, e eu estava determinado a assistir à partida.

Além das batatas (ver Kapitel XVII), do problema do idioma, da burocracia (ver Kapitel XL) e do choque cultural, uma dificuldade que encontro aqui na Alemanha é a distância do meu Mengão. Ainda assim, apesar de não ser tão fácil, nem de estar nas condições ideais, já consegui assistir a algumas partidas. Tento pegar pela internet alguma transmissão e, quando não consigo, minha irmã gentilmente cede seu quarto em nosso apartamento no Rio de Janeiro para minha santa mãezinha telefonar para mim pelo Skype e virar a webcam de frente para a tevê. É claro que é uma forma precária de assistir à televisão, parece uma transmissão dos anos 70: cores estouradas, tamanho de tela pequeno, listras e sombras que se movem insistentemente na imagem. Mas é melhor do que ficar sem o meu Flamengo, afinal, como brilhantemente compôs Lamartine Babo: “Eu teria um desgosto profundo se faltasse o Flamengo no mundo”.

Na quarta-feira, no entanto, havia outro complicador: diferentemente das partidas do Flamengo a que tinha assistido desde que aqui cheguei, esta não aconteceria à tarde no Brasil, mas à noite. Juntando-se o fuso horário ao maldito horário de verão que está vigorando nos frios dias alemães, aqui são cinco horas mais tarde que no sudeste brasileiro! Mas era um jogo de vida ou morte e, nessas situações, são necessárias medidas drásticas.

Após terminar o que tinha para ler, à meia-noite, marquei o despertador para as duas e meia da madrugada. Acordei meio tonto, mas fiquei a postos. Minha mãe preparou tudo no Skype, mas acabei conseguindo pegar uma transmissão da Fox Sports na internet, com imagem bem menos ruim. A narração em espanhol dava um toque especial a essa partida tão internacional entre os mais populares times do Brasil.

Os 2 a 0 do Corinthians no primeiro tempo davam uma sensação dupla de frustração: o Mengo ser eliminado já seria horrível, mas ele ser eliminado comigo acordado às três e tanto da manhã para poder assistir seria ainda pior. Entretanto, o segundo tempo foi só alegria! O gol de Vagner Love só não foi mais comemorado porque eu precisava ficar mudo, já que era o único acordado em toda a vizinhança. Vibrei a la cinema mudo. Depois, fui dormir às cinco da manhã – para ter aula (à tarde, pelo menos) no dia seguinte. Tinha a sensação de dever cumprido!

Flamengo classificado e, no dia seguinte, era dia de vestir rubro-negro. Pus o manto sagrado, mas, infelizmente, ele ficou quase o tempo todo escondido pelo meu casaco mais grosso. Diferentemente do calor ensolarado do Rio, aqui esta quinta-feira foi dia de chuva e frio. Mas, apesar disso, mostrei com orgulho a camisa. Ser Flamengo, afinal, não é para qualquer um. É “só” para trinta e cinco milhões de felizardos. De um lado ou do outro do Atlântico.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Kapitel XLIII – Um Trem, Três Chuvas, Treze Horas

Acordei cedo neste domingo porque tinha planos bem diferentes em relação aos domingos anteriores. Eu me programei para, pela primeira vez, sair de Frankfurt! Resolvi fazer minha primeira de muitas viagens na Alemanha. Comecei de leve, escolhendo cidades próximas. Mas logo três de uma vez!

Tomei meu café-da-manhã, saí às 8h45 por pura lerdeza (tinha acordado às 7h!) e parti para a estação de metrô. Lá, astutamente comprei a passagem de acordo com o meu plano; vejam só quanta esperteza! Selecionei três cidades que têm o mesmo código de distância em relação a Frankfurt, 65, ou seja, a passagem de ida ou volta para qualquer uma delas custa 7,15 euros. Como não sou bobo nem nada, comprei a passagem de dia todo para o código 65, que custa 14,30 euros. Ou seja, pelo mesmo preço que eu pagaria para ir a uma das três cidades e voltar, eu viajei por todas elas!

A primeira da minha rota era Wiesbaden. Apesar de Frankfurt ser bem maior e mais importante, é ela a capital do estado onde moro, Hesse. São bonitos os prédios do governo, como o da assembleia legislativa Landtag, mas o que mais chama a atenção, logo de cara, é sem dúvida a igreja neogótica Marktkirche. Por dentro, é até razoavelmente simples, mas por fora sua construção em tom de tijolo impressiona. Andando mais um pouco pelas ruas, deparei-me com blocos, peças e resquícios de um antigo aqueduto dos antigos romanos. Muito legal! Ah, e há torneirinhas espalhadas pela cidade onde se pode pegar suas famosas águas termais, que inclusive dão o nome à cidade (Wiesbaden significa “banhos da pradaria”).

Já cansado e com fome, estava quase na hora de trocar de cidade, mas antes faltava ir a um lugar: Neroberg, a parte mais alta de Wiesbaden. Havia duas atrações lá que eu não podia perder: a igreja ortodoxa russa e o teleférico. Difícil foi descobrir como ir para lá. Perdido, pedindo orientações, acabei perguntando a uma senhorinha que – vejam só! – me ofereceu carona. Ela me perguntou se eu era espanhol ou italiano e, quando disse que era brasileiro, falou que esteve por dois dias no Rio de Janeiro e que já conheceu a Argentina e o Peru, onde o marido dela trabalhou. Tentou arranhar um castelhano, mas ele não era muito melhor do que o meu alemão. Não precisei esperar ônibus nem nada, ela me deixou exatamente no ponto do teleférico. Comprei a passagem e subi.

Lá em cima a vista não era tão boa quanto eu supunha. Havia muitas árvores tapando um pouco os mirantes e, principalmente, os pontos mais atraentes da cidade lá embaixo ficavam muito distantes do Neroberg. A igreja ortodoxa russa Elisabeth (vários nobres russos se mudaram para a cidade antes da revolução comunista) também é bonita, com suas cúpulas douradas. Entrei e achei lá dentro surpreendentemente pequeno para o tamanho que ela tem por fora. Não tenho certeza, mas acho que vi um papel lá dentro dizendo que custava 1 euro ou 1,50 euro para entrar na igreja. Ora, não havia quase nada para ver lá dentro (precisei de 6 segundos para dar uma geral no lugar) e, ainda por cima, era proibido fotografar... será que ainda assim eles cobram?! Na dúvida, saí de fininho. O curioso é que, além da placa de proibição de fotografar, havia uma proibindo a entrada de cachorro! Achei hilário, mas talvez aqui seja preciso avisar, pois poucos são os lugares onde os caninos não entram (ver Kapitel VIII).

Havia mais um ponto interessante lá em cima: uma floresta! Na parte mais próxima do estaciona-mento, do mirante, do teleférico e do restaurante havia cordas e construções no alto das árvores para as crianças. Avançando mais, no entanto, havia um “caminho do filósofo” que seguia mata adentro, onde se viam poucas e afastadas construções da administração do parque. Achei muito interessante ver uma floresta temperada; as folhas das árvores davam a impressão de estarem flutuando, pela sua disposição em arcos.

Para descer do Neroberg foi fácil: havia um ônibus que saía direto de lá e ia até a parte central da cidade. Ele iria até a estação central de trem, mas saltei antes porque, mais cedo, a Marktkirche estava fechada e só tinha podido vê-la por fora. Pois na caminhada da igreja até a estação de trem desandou a chover. Eu tinha guarda-chuva, mas o coitado ficou todo desmantelado desde a primeira chuva de verão que me pegou aqui em Frankfurt (impossível esquecer, na primeira vez em que vi o rio Main e fui ao bairro de Sacksenhausen, o vento virando meu guarda-chuva pelo avesso). A verdade é que, desde então, ele está mais para capa do Batman do que para algo que evite que eu me molhe; aliás, não sei se fico mais molhado com ou sem ele.

Parti para o segundo ponto da viagem: Hochheim. É uma cidadezinha bem menor que as outras duas e ninguém dá nada por ela, mas foi uma boa dica do Jens. Trata-se de uma cidade do interior, mas na Alemanha, ou seja, cheia daquelas pitorescas casinhas germânicas e ruazinhas estreitas. Além disso, tem uma característica que a diferencia da grande maioria das cidadezinhas de interior do mundo todo: lá, os restaurantes não fecham cedo, e as pessoas vão almoçar nos mais diversos horários, como 4 ou 5 da tarde.

Após dar uma volta (e tomar a segunda chuva do dia), já roxo de fome, escolhi um dos vários restaurantes especializados em vinho. Para dizer a verdade, o vinho (pedi o da casa) não era grande coisa, estava mais para suquinho de uva. Mas o prato estava ótimo! Pela primeira vez provei um chucrute na Alemanha. Não achei melhor do que os que havia comido no Brasil, mas estava bom. O chucrute acompanhava uma lingüiça chamada Bauern Bratwurst, que, esta sim, estava deliciosa.

Era o momento de seguir para meu destino final: Mainz, ou Mogúncia, que é como a cidade se chama em português. Apesar de bem próxima de Frankfurt e de Wiesbaden, ela fica em outro estado, Renânia-Palatinado (Rheinland-Pfalz), do qual é a capital. Já não estava mais cedo, passava das cinco. O caminho para Mainz – digo, Mogúncia (é esquisito esse nome, não é?) – também não era tão simples quanto o que fiz para Hochheim. Eu precisava ir até uma estação chamada Mainz-Kastel e, ali perto, pegar um ônibus para a estação central de Mainz, de Mogúncia, ou seja lá como vocês quiserem chamar.

Saltei em Mainz-Kastel, que é um distrito administrado por Wiesbaden e que outrora pertenceu a Mainz/ Mogúncia. Enquanto procurava a estação de ônibus, até explorei aquela área da cidade, mas ela carecia de atrativos, e não por acaso não estava em minha rota planejada. O ponto mais bonito da cidade era a vista para o rio Main e para o outro lado da margem, onde ficava Mogúncia/Mainz.

Soube que Mainz ficava lá justamente quando encontrei o ponto de ônibus. Mas o tempo passava e o raio do coletivo não chegava. Olhei para aquela ponte, ela olhou para mim, e foi irresistível atravessá-la. Afinal, mesmo que a estação central não fosse perto do rio (e não era), ali havia coisas bonitas que eu queria ver de perto. O que não foi bonito foi a chuva que caiu quando eu estava no meio do caminho. Foi mais forte que as duas anteriores, juntas! Meu guarda-chuva batia asas, cruzava os braços, fazia piruetas, tudo menos me proteger do aguaceiro. Até então, as chuvas estavam chatinhas; naquele momento, ela ficou realmente insuportável.

Assim que vi um lugar aberto, entrei. Bebi uma Paulaner e esperei a chuva pelo menos voltar ao estágio de “chatinha”. A verdade é que com aquela chuva, àquela hora, e ainda por cima num domingo (quando muita coisa está fechada), meu aproveitamento de Mainz não foi tão bom como o das outras cidades. Mogúncia tem alguns museus interessantes, e todos obviamente estavam fechados. Há o museu estadual, um museu romano-germânico e o Museu de Gutenberg. Ah, sim! Gutemberg está para Mogúncia como Goethe está para Frankfurt. O inventor da imprensa nasceu lá em Mainz e, tal como ocorre com o poeta na cidade onde moro, tudo o que se refere a Gutenberg é ressaltado. Ele tem estátua, museu e até uma igreja em ruínas que – claro! – é onde ele supostamente foi batizado.

Voltarei a Mogúncia (já estou me acostumando com esse nome...) em algum momento. Há lugares para visitar e mesmo o que eu vi e achei bonito merece uma visão mais ensolarada e sem a chuva atrapalhando. Um dos lugares que preciso visitar novamente é a catedral. Quando cheguei lá, havia duas garotas conversando diante da porta semiaberta. Pedi licença e entrei. A igreja estava sinistramente escura, com pouquíssimas luzes, em parte quase que apenas iluminada por velas. Assim mesmo, dei uma volta lá por dentro. Não dava para ver tão bem, mas já tinha me deslocado até lá e serviria para ter uma ideia, antes de viajar para lá novamente. Quando eu chegava na saída, um funcionário estava trancando a igreja! Ele levou um susto, perguntou como entrei e se havia mais alguém lá. Quase fico trancafiado dentro da catedral!

Depois do susto, já exausto, era hora de voltar. Demorei algum tempo e perguntei algumas vezes até encontrar a estação de trem. Também precisei de umas tantas voltas na estação e de fazer algumas perguntas até saber que trem pegar e em que parte ele chegaria, para voltar a Frankfurt. Foi curioso ver que, quando perguntei a um turco, ele chamou a criança que estava com ele para falar comigo, pois ela entendia melhor alemão que ele.

Apertado, fui ao banheiro e... não pude usá-lo! Era pago – custava 50 cêntimos – e só aceitava moedas de 50, 20 ou 10 cêntimos. Eu tinha moedas de 1 cêntimo, de 1 euro, uma única de 10 e outra de 20, nenhuma de 50; ou seja, eu não tinha 50 cêntimos trocados para poder pagar pelo uso do banheiro.

Após entrar no trem da linha S8, saltei na estação Hauptwache, onde há conexão com as linhas de metrô que fazem o trajeto norte-sul. Entrei no metrô rumo ao norte e saltei uma estação antes da minha, para comprar mantimentos. Afinal, no café-da-manhã eu tinha acabado com o queijo e com o frio Bierschinken (não faltam frios diferentes aqui; até mortadela com pistache eu já tracei). Para a noite, portanto, só me restava comer pão com pão, ou fazer compras. Mas, apesar da latente vontade de ir ao banheiro, isso não seria um grande problema para mim, pois há um supermercado Rewe 24 horas ali em frente à estação de metrô anterior. Não seria se não fosse por um detalhe que eu não tinha percebido: ele é 24 horas e segunda-feira a sábado!

Frustrado, voltei para o metrô e finalmente saltei em Dornbusch. A vontade de ir ao banheiro era grande mas o problema da fome precisava ser resolvido. A pizzaria perto da minha casa, Pizzeria da Benito (nunca entendi por que “da” e não “do”), estava aberta mas com cara de que estava fechando. Perguntei, e ela estava mesmo encerrando o expediente, mas o italiano resolveu fazer minha pizza. Foi a última pizza do dia no restaurante! Estava gostosa, com um pepperoni – aqui chamado de Pepperoniwurst – bem apimentado.

Trouxe a pizza para casa, pois a pizzaria estava fechando e eu tinha um assunto urgente para resolver. Assunto pendente desde a estação de metrô de Mogúncia/Mainz! Cheguei em casa às 20h50, 13 horas depois de pôr os pés na rua. Aliviei minha bexiga e pude saborear a pizza tranqüilamente. A propósito, como será que eu faria se tivesse ficado na catedral?!