Um brasileiro que fala um alemão macarrônico chega a Frankfurt sem saber nem mesmo onde vai morar... Aqui narro minhas aventuras nesta temporada germânica: lugares interessantes, enrascadas em que me meto, esquisitices que percebo a cada dia. O nome do blog é uma analogia aos irmãos Grimm, alemães que compilaram muitas dezenas de contos de fada tradicionais, como Branca de Neve, João e Maria, Rapunzel, a Gata Borralheira, o Músico Maravilhoso, Chapeuzinho Vermelho, e a Bela Adormecida (mais detalhes em Vorstellung).

Centenas de fotos disponíveis em Ilustrações.


sexta-feira, 7 de maio de 2010

Kapitel XLIV – O Urubu e o Corujão

Quarta-feira teria sido mais um dia trivial, em que não fui à universidade, estudei em casa, almocei um sanduíche, esquentei um Schnitzel congelado para a janta, saí com Manfred para trocar um pacote de café (estou experimentando para ver qual é meu café preferido, mas, estupidamente, tinha comprado por engano a mesma marca que havia julgado ruim). Sim, teria sido mais um dia trivial se não fosse pelo fato de que o Flamengo enfrentaria o Corinthians em um jogo decisivo pela Taça Libertadores, e eu estava determinado a assistir à partida.

Além das batatas (ver Kapitel XVII), do problema do idioma, da burocracia (ver Kapitel XL) e do choque cultural, uma dificuldade que encontro aqui na Alemanha é a distância do meu Mengão. Ainda assim, apesar de não ser tão fácil, nem de estar nas condições ideais, já consegui assistir a algumas partidas. Tento pegar pela internet alguma transmissão e, quando não consigo, minha irmã gentilmente cede seu quarto em nosso apartamento no Rio de Janeiro para minha santa mãezinha telefonar para mim pelo Skype e virar a webcam de frente para a tevê. É claro que é uma forma precária de assistir à televisão, parece uma transmissão dos anos 70: cores estouradas, tamanho de tela pequeno, listras e sombras que se movem insistentemente na imagem. Mas é melhor do que ficar sem o meu Flamengo, afinal, como brilhantemente compôs Lamartine Babo: “Eu teria um desgosto profundo se faltasse o Flamengo no mundo”.

Na quarta-feira, no entanto, havia outro complicador: diferentemente das partidas do Flamengo a que tinha assistido desde que aqui cheguei, esta não aconteceria à tarde no Brasil, mas à noite. Juntando-se o fuso horário ao maldito horário de verão que está vigorando nos frios dias alemães, aqui são cinco horas mais tarde que no sudeste brasileiro! Mas era um jogo de vida ou morte e, nessas situações, são necessárias medidas drásticas.

Após terminar o que tinha para ler, à meia-noite, marquei o despertador para as duas e meia da madrugada. Acordei meio tonto, mas fiquei a postos. Minha mãe preparou tudo no Skype, mas acabei conseguindo pegar uma transmissão da Fox Sports na internet, com imagem bem menos ruim. A narração em espanhol dava um toque especial a essa partida tão internacional entre os mais populares times do Brasil.

Os 2 a 0 do Corinthians no primeiro tempo davam uma sensação dupla de frustração: o Mengo ser eliminado já seria horrível, mas ele ser eliminado comigo acordado às três e tanto da manhã para poder assistir seria ainda pior. Entretanto, o segundo tempo foi só alegria! O gol de Vagner Love só não foi mais comemorado porque eu precisava ficar mudo, já que era o único acordado em toda a vizinhança. Vibrei a la cinema mudo. Depois, fui dormir às cinco da manhã – para ter aula (à tarde, pelo menos) no dia seguinte. Tinha a sensação de dever cumprido!

Flamengo classificado e, no dia seguinte, era dia de vestir rubro-negro. Pus o manto sagrado, mas, infelizmente, ele ficou quase o tempo todo escondido pelo meu casaco mais grosso. Diferentemente do calor ensolarado do Rio, aqui esta quinta-feira foi dia de chuva e frio. Mas, apesar disso, mostrei com orgulho a camisa. Ser Flamengo, afinal, não é para qualquer um. É “só” para trinta e cinco milhões de felizardos. De um lado ou do outro do Atlântico.

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