Um brasileiro que fala um alemão macarrônico chega a Frankfurt sem saber nem mesmo onde vai morar... Aqui narro minhas aventuras nesta temporada germânica: lugares interessantes, enrascadas em que me meto, esquisitices que percebo a cada dia. O nome do blog é uma analogia aos irmãos Grimm, alemães que compilaram muitas dezenas de contos de fada tradicionais, como Branca de Neve, João e Maria, Rapunzel, a Gata Borralheira, o Músico Maravilhoso, Chapeuzinho Vermelho, e a Bela Adormecida (mais detalhes em Vorstellung).

Centenas de fotos disponíveis em Ilustrações.


quinta-feira, 29 de abril de 2010

Kapitel XL – Caminhos Tortuosos até as Boas Novas

Hoje era o dia da verdade. Fui à universidade me encontrar com o Jens, que iria comigo até o Ausländerbehörde solicitar meu visto. Em caso de sermos bem-sucedidos, ainda passaríamos no Postbank e eu abriria minha conta bancária lá (como eu disse no Kapitel anterior, ter o visto era um pré-requisito para abrir conta em um banco alemão).

Chegando em nosso primeiro e principal destino, uma boa notícia: a bruxa não estava lá (sobre a megera que me atendeu da outra vez, ver Kapitel XXVI). Na nossa vez, Jens começou a explicar a situação para a moça que nos atendeu e, assim que lhe disse ter trocado e-mails com um funcionário lá do Ausländerbehörde, ela prontamente nos encaminhou para a sala dele. A verdade é que não era, realmente, para irmos para lá. Só que os funcionários querem acabar com sua fama histórica de extremamente lentos e, por isso, estão atendendo o mais rápido possível; mas não conseguem trabalhar eficientemente nessa velocidade. Assim, a bruxa da outra vez nem tinha olhado meus documentos direito e me disse para fazer dez milhões de coisas. A atendente de hoje, por sua vez, encaminhou-nos para o lugar errado. O negócio é se livrar o mais rápido possível de nós, para que fique registrado que o atendimento foi rápido.

A verdade é que esse erro da funcionária veio bem a calhar. Apesar de o cara que nos atendeu não ser o encarregado do assunto, ele acabou segurando o abacaxi, já que estava por dentro do meu caso, devido à troca de e-mails com o Jens. Era um sujeito daqueles meio metidos a garotão, com cabelo grisalho arrepiado para fazer estilo. O cara deve fazer mergulho, pois tinha várias boas fotos do fundo do mar coladas na parede. Entre elas a de uma intrigante lagosta azul, que eu nem sabia que existia.

Já não sou mais oficialmente um turista, nem um candidato a imigrante ilegal. O funcionário-garotão conseguiu meu visto! Não sem antes fazer um doce, dizendo que abriram uma exceção, que se tivesse levado as regras ao pé da letra eu realmente teria que voltar para o Rio de Janeiro para pegar meu visto, e blábláblá-blablablá. Também não sem antes fazer uma piadinha sobre a capacidade de trabalho das mulheres lá do Ausländerbehörde. Tive ainda que pagar uma taxa de 50 euros, o que é um absurdo, já que no consulado alemão no Rio estava claramente explicado que pesquisadores bolsistas não precisam pagar para tirar o visto. Mas não discuti, afinal, queria me livrar logo desse problema, e uma passagem de ida e volta para o Rio custaria “ligeiramente” mais caro que cinqüenta euros.

Meu passaporte agora está “carnavalesco”, com um enorme adesivo em verde e rosa (cores da Estação Primeira) ocupando duas páginas. No adesivo constam não apenas meus dados básicos, mas também a informação de que sou um pesquisador-visitante/doutorando convidado pelo departamento de ciência política da Universidade de Frankfurt. Até o nome do Jens aparece na descrição! Mais detalhado que isso, só se dissessem que calço 42, tenho sangue A+ e gosto de cinema. O adesivo “mangueirense” deixa a forte impressão de que o cara estava mesmo fazendo gênero. Afinal, se eles normalmente não dão visto e isso é uma atribuição exclusiva dos consulados e embaixadas, por que eles tinham o adesivo?

De lá fomos direto para a estação principal de trem Hauptbanhof, onde fica a agência central do banco dos correios Postbank. Toda a papelada que preenchi na outra agência no dia anterior (Kapitel XXXIX) de nada serviu, pois o funcionário perguntou tudo novamente para preencher diretamente no computador. Agora, já tenho uma conta em um banco alemão, portanto. Só que, obviamente, nada poderia ser tão fácil: só saberei o número da conta em uns dois dias e receberei meu cartão do banco somente depois de dez dias!

Após tantos finais felizes, foi a vez de resolvermos um problema mais trivial: nossa fome. Eu e Jens fomos ao bom restaurante Pielok, ali no bairro de Bockenheim, onde eu havia provado o Grünensosse (descrito no Kapitel XVII), tradicional prato frankfurtiano, com carne bovina. Pois desta vez era Schnitzeltag, o dia em que o restaurante tem várias opções de Schnitzel, o filé empanado de porco também popularíssimo na cidade (sobre o Schnitzeltag, ver Kapitel XXIII).

Fiz, então, o que há muito tempo queria fazer, pedir a tradicional combinação frankfurtiana: Schnitzel com Grünensosse. Só que o prato vinha – adivinhem! – com batatas. Disse que não queria as batatas e o garçom perguntou se eu preferia que ele viesse – adivinhem novamente! – com batatas fritas! Qual não foi sua surpresa quando respondi que queria acompanhado de arroz. O garçom era oriental, certamente está acostumado a comer mais arroz que os alemães, mas é impossível de se descrever a cara de espanto e surpresa dele quando lhe disse que queria que viesse com arroz. Segundo Jens, ele provavelmente não ouvia tal pedido há muitos anos. Comi, então, “quase” o mais tradicional prato frankfurtiano. Acho o Frankfurter Schnitzel bastante bom e, como eu já sei que não serei deportado, certamente terei muitas oportunidades de comê-lo novamente.

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