Um brasileiro que fala um alemão macarrônico chega a Frankfurt sem saber nem mesmo onde vai morar... Aqui narro minhas aventuras nesta temporada germânica: lugares interessantes, enrascadas em que me meto, esquisitices que percebo a cada dia. O nome do blog é uma analogia aos irmãos Grimm, alemães que compilaram muitas dezenas de contos de fada tradicionais, como Branca de Neve, João e Maria, Rapunzel, a Gata Borralheira, o Músico Maravilhoso, Chapeuzinho Vermelho, e a Bela Adormecida (mais detalhes em Vorstellung).

Centenas de fotos disponíveis em Ilustrações.


domingo, 9 de maio de 2010

Kapitel XLVII – Sempre Perdido na Antiga Cidade

Ainda sem internet, pus em prática a continuação do meu plano de viajar o máximo possível em meu tempo livre. O destino deste sábado era Marburg, uma cidade bem antiga mas que, longe de ter se tornado um museu ao ar livre, é uma cidade universitária. Como eu veria uma cidade apenas e estava cansado, acordei um pouco mais tarde e acabei comprando minha passagem apenas às 11h49 (definitivamente, não sou tão controlado assim com os horários, é que a hora está gravada no bilhete). Marburg é mais longe do que as cidades para onde fui no domingo anterior (ver Kapitel XLIII), de modo que se leva mais de uma hora para chegar.

Só fui pisar na estação principal de trem (Hauptbanhof) de Marburg quase ao meio-dia. Mas seria tempo de sobra – pensei –, afinal, é a única cidade que conhecerei hoje. Seria tempo de sobra se não fosse por um detalhe: além de ser antiga, charmosa e bonita, Marburg tem outra característica marcante, a de ser pessimamente sinalizada! Simplesmente não há sinalização na Hauptbanhof dizendo em que direção ir para chegar à Marktplatz (ou praça do mercado, a principal da cidade, onde fica a prefeitura) e ao centro antigo (Altstadt). No meio da cidade também não encontrei nenhuma sinalização da localização da Marktplatz, só vi uma do Altstadt (já quando voltava), e não é fácil ver uma placa indicando o sentido da Hauptbanhof.
A conseqüência da má sinalização é que gastei um bom tempo dando a volta ao mundo. É claro que não ajudou em nada minha estúpida decisão de não pedir informações quando ainda estava na estação. Além disso, minha experiência da viagem da semana anterior já tinha me deixado uma dica: quando não souber para onde ir ao sair de uma estação central de trem em uma cidade alemã, se houver uma rua chamada Banhofstraße, siga por ela, pois são grandes as chances de você chegar nos principais lugares. Mas eu não segui a dica, sabe-se lá por quê...

Passei por uma área bem verde e residencial, onde havia um rio com patos e pedalinho. Andei muito, até chegar finalmente ao centro antigo. Entrei em uma bela igreja gótica do século XIII, a Elizabethkirche
Ali perto, seguindo por uma ruela, cheguei a uma humilde capela de São Miguel (St. Michaels-Kapelle), a “Michelchen”, mais ou menos da mesma época. A entrada estava fechada, mas, em uma placa que vi pouco depois, explicava-se que a Elizabethkirche era freqüentada pela nobreza, enquanto que os peregrinos faziam suas orações na capela.
Do lado de fora da capela havia um cemitério, e dentro da igreja Elizabethkirche não faltavam nem sepulcros de antigos nobres, nem brasões nas pilastras. Entrei ainda na bonita Igreja Paroquia  (Pfarrkirche) St. Marien, presbiteriana, e vi no centro antigo muitas casas interessantes, em estilo tipicamente alemão. Merece destaque a fortaleza Festung Marburg, enorme, erguida entre 1550 e 1886, localizada no ponto mais alto da cidade.

Eu tinha saído de casa após comer apenas um sanduíche de café-da-manhã, e só fui almoçar lá quase às seis e meia. Nesse intervalo, tomei apenas dois sorvetes de casquinha. Aliás, as bolas de sorvete são mais generosas em Frankfurt do que em Marburg (e o preço é equivalente: geralmente cobram 80 cêntimos em Frankfurt e lá paguei 70 em uma sorveteria e 80 na outra). Minha ideia era, depois de almoçar, entrar em uma taverna no subsolo, que parecia interessante, para tomar uma cerveja. Mas como lá eles não serviam comida, pesquisei outro lugar para almoçar.

Acabei achando um restaurante onde pedi um Schnitzel 'Zigeuner Art' (sobre esse prato, ver o Kapitel XXX). Para beber, uma caneca de cerveja Krombacher. A garçonete perguntou “Kleine oder grosse?”, e eu respondi que queria a grande, é claro. Enquanto eu esperava, a temperatura caiu vertiginosamente, de modo que eu já estava tremendo. Minha intenção era comer do lado de fora, olhando a cara da cidade, mas não agüentei e entrei. O prato não chegou tão rápido e meus 500 ml de cerveja “evaporaram” antes de a comida ser servida. Quando chegou o Schnitzel, fui obrigado a pedir mais meio litro de cerveja. Desta vez, após consultar o cardápio, pedi a versão escura de trigo da Krombacher.

O Scnhtitzel estava ótimo e vinha muito bem servido. Aproveitei ainda para pedir sobremesa. Já havia comido na Alemanha salsichão, porco, chucrute, bebido cerveja... tirando as batatas (que não como), é claro, só faltava uma coisa estereotipicamente alemã: o Apfelstrudel, a torta de maçã. Pois pedi um de sobremesa. Vinha quente, acompanhado com sorvete de creme e um chantilly. O pedido da sobremesa foi motivado tanto por querer provar essa iguaria germânica em território alemão como pela intenção de cortar um pouco o álcool (um litro de cerveja forte não é pouca coisa).

Era, então, o momento de procurar o caminho de volta para casa. Como vocês sabem, esse freqüentemente é um problema para mim comparável ao de João e Maria no conto de fadas (felizmente, para mim, a bruxa só apareceu no Kapitel XXVI). E a situação piora muito com a sinalização de Marburg. E não venham culpar a cerveja, pois eu estava bem sóbrio. Se não estivesse, certamente teria sido impossível articular, em alemão, perguntas como “onde fica a estação de trem?” e “como vou à estação de trem?”.

Cada vez que seguia uma placa, andava muito até chegar a algum caminho que tinha uma bifurcação ou que fazia uma curva, claramente se desviando da indicação. Estava claro que não havia placas para guiar ao longo de todo o percurso. Eu andava, andava, e quando achava outra placa, ela indicava uma direção totalmente diferente, pois em algum momento eu escolhi o lado errado e não havia uma placa para evitar isso. Pedi várias vezes informações, mas não era fácil entender o que as pessoas diziam (mesmo perdido, sempre insisto em perguntar em alemão, e só falo em inglês se as pessoas sugerirem).

Eu temia estar perdido no meio do caminho com a noite já escura, mas ainda estava razoavelmente claro quando cheguei à estação, às nove e pouquinho. Vi que o ônibus para Frankfurt só passaria às 21h30. Aproveitei para ir ao banheiro... que estava trancado! Pensei, irritado: “claro, o que alguém pode querer fazer em um banheiro fora do horário comercial, não é mesmo?”. Os banheiros das estações de trem realmente parecem não gostar de mim (sobre a situação anterior, na estação de Mogúncia/Mainz, ver o Kapitel XLIII).

Como eu tinha tempo, decidi ir a algum bar próximo para desidratar meu joelho e beber alguma coisa (não alcoólica!). Fui a um restaurante de döner kebap, esvaziei a bexiga e fui ver o que tinham de bebida. Fiquei intrigado com uma bebida turca que eles vendiam, que levava iogurte, chamada ayram. Corajosamente, arrisquei mais uma vez. Precisava provar. Além do mais, era barata, mais até do que a água mineral. No copo se informava que o ayram é constituído de iogurte, água e sal. Não gostei não. Parece um iogurte azedo, só isso. Mas bebi. Quem sabe não cortava o álcool?

O transporte público na Alemanha é reconhecido, com justiça, por sua impressionante pontualidade. Mas não é infalível. O trem, que eu tinha que esperar meia hora para chegar, atrasou ainda outros onze minutos. Só cheguei em casa às onze. Tinha combinado de sair com Vítor e Filipe, mas não só cheguei tarde como não consegui falar com eles. Suspeito que estou sem crédito no celular (só suspeito, porque não consigo entender o recado). Não consegui sair à noite nem sexta, nem sábado. Estou sem celular e sem internet... está complicada a minha situação. Pelo menos, estou conseguindo colocar o pé na estrada, digo, na linha férrea.
 
 

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