Um brasileiro que fala um alemão macarrônico chega a Frankfurt sem saber nem mesmo onde vai morar... Aqui narro minhas aventuras nesta temporada germânica: lugares interessantes, enrascadas em que me meto, esquisitices que percebo a cada dia. O nome do blog é uma analogia aos irmãos Grimm, alemães que compilaram muitas dezenas de contos de fada tradicionais, como Branca de Neve, João e Maria, Rapunzel, a Gata Borralheira, o Músico Maravilhoso, Chapeuzinho Vermelho, e a Bela Adormecida (mais detalhes em Vorstellung).

Centenas de fotos disponíveis em Ilustrações.


sexta-feira, 16 de abril de 2010

Kapitel XXVIII – Achados e Perdidos

Comecei o dia com uma trapalhada. Geralmente, vou até a estação de metrô de Dornbusch, perto de minha casa, por uma galeria subterrânea (como aquelas que temos em alguns lugares no Rio, como o Aterro; só que aqui você não é assaltado ao passar por ela). Hoje, no entanto, resolvi ir por cima. O resultado de ter ido por um caminho diferente foi que eu peguei o metrô no sentido errado.

Totalmente desligado, entrei no metrô e as estações foram passando. Em determinado momento, finalmente me dei conta de que não fazia sentido eu estar por tanto tempo vendo o céu de dentro do vagão se: (1) eu pretendia ir no sentido sul, e (2) entre as estações em que o metrô passa pela superfície, Dornbush é a estação mais a sul. Não era necessário nenhum brilhantismo para entender que eu estava indo para norte. E fui longe! Andei cinco estações no sentido errado, passei até pelo outro rio que corta Frankfurt, o Nidda (o Main é o rio principal). Saltei na estação Heddernheim, que é a última antes de as linhas U1, U2 e U3 do metrô, que até ali fazem o mesmo percurso, separarem-se. Hoje eu simplesmente alcancei o ponto mais setentrional da minha vida, nunca tinha estado em uma latitude tão alta!

Por sorte eu não tinha um motivo forte para chegar cedo na universidade, de modo que minha demora foi apenas um fato curioso, não um problema. Após ver com o Jens os formulários para um possível segundo pedido de visto (sobre a novela do visto, ver os Kapitel XX, XXI e, principalmente, o XXVI) e de estudar um pouco, fui almoçar no bandejão Mensa com o Bertram e com um outro aluno de mestrado, Florian.

Bem, talvez seja o momento de explicar melhor isso. Há pelo menos três categorias diferentes de mestrado na Alemanha. Aquele que o Florian faz não é o mesmo que o do Bertram, e ambos são diferentes do que é feito por Fabian, com quem almocei na primeira vez que fui ao Mensa (ver Kapitel XXIV). Antigamente, havia na Alemanha dois tipos diferentes do que chamamos de mestrado (apesar de aqui ele não ser separado da graduação como é no Brasil): o Magister e o Diplom. Segundo Florian, enquanto no primeiro o aluno escolhe um tema de estudo principal e alguns secundários, no Diplom ele basicamente fica com apenas um tema. Bertram está terminando o Magister, Florian está no Diplom. Fabian não faz nenhum dos dois: está no Master.

A Alemanha, assim como outros países, está reformulando seu sistema de ensino, para que todos da União Europeia fiquem padronizados (no tal “processo de Bolonha”, como é chamado). Então, criou-se uma nova categoria de mestrado, o Master. Só que ainda há alunos que não concluíram o Magister ou o Diplom, de modo que, neste período de transição, há esta profusão de diferentes tipos de mestrado simultâneos.

Florian, que eu tinha visto apenas uma vez, sem conversar, também é um cara legal, como os outros dois. É um simpatizante do Partido Social-democrata da Alemanha, sua dissertação é uma análise comparada sobre as políticas de justiça em países redemocratizados para os perseguidos pelas ditaduras, e viveu por seis meses na Colômbia. Curiosamente, foi aluno do Jens também quando este lecionava na Universidade de Postdam. Tem um jeito que é, ao mesmo tempo, crítico e pragmático. Prometeu me mostrar um livro que ele tem sobre meu tema de pesquisa.

Pouco depois, fui com Jens para a aula em que o ajudo, sobre política e sociedade no Brasil. Na verdade, o nome do curso é Politik und Gesellschaft in Brasilien. Sim... é isso mesmo o que vocês estão pensando: o curso é em alemão! Hoje foi apenas uma aula de explicação geral sobre o curso, em que o Jens me apresentou para a turma, e em que eu entrei mudo e saí calado. É engraçado estar do outro lado da sala de aula. Até que consegui entender, em linhas gerais, uns 30% do que ele disse, o que me pareceu um desempenho bastante honrado. A tendência é que eu fale e me façam perguntas em inglês, apesar de todas as demais discussões e a exposição do Jens serem em alemão. Se eu souber dizer alguma coisa em alemão, falarei. Só espero que isso não gere risadas dos alunos.

Depois, fui à aula de alemão. A surpresa desagradável é que mudaram o horário da aula, que agora ocorrerá ao mesmo tempo que meus seminários sobre política brasi... digo, sobre Politik und Gesellschaft in Brasilien. Agora, procurarei descobrir se há algum outro curso de alemão na universidade em um bom horário. Mas há males que vêm para o bem. Havia um cara na sala conversando com a professora. Quando eles pararam de falar, pedi licença e perguntei para ela sobre a mudança de horário. Eis que ele se dirigiu a mim e perguntou: “ah, você é brasileiro?”. Ele disse que minhas hesitações para falar eram típicas de um brasileiro.

Fomos tomar um café e acabei fazendo mais um amigo brasileiro por aqui. O nome dele é Vítor, está morando aqui há praticamente o mesmo tempo que eu, e também veio para um período sanduíche de seis meses na Universidade de Frankfurt. Faz doutorado na USP em filosofia do Direito e estuda teoria crítica. É muito gente boa e disse que vai me apresentar um amigo pernambucano, que faz aula com ele e é doutorando aqui mesmo. Os brasileiros sempre se encontram!

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