Um brasileiro que fala um alemão macarrônico chega a Frankfurt sem saber nem mesmo onde vai morar... Aqui narro minhas aventuras nesta temporada germânica: lugares interessantes, enrascadas em que me meto, esquisitices que percebo a cada dia. O nome do blog é uma analogia aos irmãos Grimm, alemães que compilaram muitas dezenas de contos de fada tradicionais, como Branca de Neve, João e Maria, Rapunzel, a Gata Borralheira, o Músico Maravilhoso, Chapeuzinho Vermelho, e a Bela Adormecida (mais detalhes em Vorstellung).

Centenas de fotos disponíveis em Ilustrações.


terça-feira, 6 de abril de 2010

Kapitel XVIII - O Andarilho e a Portuguesinha, entre a Pimenta e a Marvada

Ontem, Manfred recebeu visitas. Estava no meu quarto, quieto em meu canto, quando bateram à porta. Essa era a senha para a perdição. Um dos convidados ofereceu uma cerveja chamada Rothaus Pils - Tannen Zäpfle. Aceitei e, uma vez encerrada a garrafa, ele começou a servir vinho branco. Não fiz desfeita e bebi, já me sentindo levemente alterado. Passado algum (pouco e insuficiente) tempo, ele teve a ideia (já que eu sou brasileiro) de servir cachaça. Não me deixaram beber apenas um copinho e logo tive que tomar o segundo. Quando parecia que finalmente havia terminado, eis que ele apareceu com uma garrafa de tequila (de onde ele tira tanta bebida?!). Virei o copo e, usando o que me restava de senso de responsabilidade, peguei um Engov para sobreviver até o dia seguinte.

Comecei o dia sem saber ao certo se valia a pena ter sobrevivido. É que hoje tive que ir à universidade apenas porque fiquei com a chave de uma das salas, e um cara precisaria dividi-la comigo. Acontece quer o Jens só iria na quarta-feira. Sem ele, tudo o que eu tenho para fazer lá é usar a internet ou ler, coisas que posso fazer no conforto do lar e economizando a caríssima passagem de metrô. O pior é que o cara ainda demorou um bocado para chegar e, até a hora em que fui embora, não usou a sala, ficou só zanzando para lá e para cá. Além disso, eu tinha a intenção de ir embora na hora do almoço, porque tinha coisas urgentes a resolver (tirar dinheiro e regularizar minha situação no país). Só que a secretária não apareceu na universidade hoje e, pouco antes da hora em que eu pretendia sair, Marion e o cara foram almoçar. Logo, estava eu novamente sem ter para quem dar a chave. Só pude ir quando eles voltaram do almoço.

Já estressado, saí, a pé (evitarei ao máximo usar transporte público; sempre fiz caminhadas longas no Rio e não há por que não fazê-las aqui), para resolver os problemas que foram adiados pelo loooongo feriado santo de sexta a segunda (ver Kapitel XVI). Minha ideia era ir ao consulado brasileiro pegar o meu visto de mais de seis meses de permanência, que não ficou pronto no consulado alemão no Rio a tempo, e passar no Banco do Brasil para pegar dinheiro. Eu tinha menos de cinco euros na carteira (não, eu não tinha nenhum euro em casa, todo o restante do meu dinheiro estava no Banco do Brasil!) e acumulo uma dívida de 600 euros com o dono do apartamento (virtualmente, tenho o dinheiro para pagar, mas não consegui sacá-lo ainda).

Demorei muito para encontrar o consulado brasileiro. Fica na esquina de Hansaallee com Vogtstraße, sendo que o endereço é na primeira rua mas foi a outra que ficou na minha cabeça. Fiquei, então, procurando um número que não existia na Vogtstraße. Meu erro seria facilmente perceptível se não fosse pelo fato de que tal rua tem uma numeração totalmente caótica, em que os ímpares não acompanham os pares, há quarteirões em que a numeração aumenta e outros em que diminui. Finalmente encontrado o consulado, peguei minha senha, mas senti que a coisa ia demorar. Fui então ao Banco do Brasil.

Chegando ao banco, dei a sorte de ser atendido por uma charmosa portuguesinha, chamada Micaela, que me atendeu mui gentilmente na língua pátria (acho que era a única lá que falava português). Infelizmente, as informações que ela tinha para me dar não eram as que eu esperava: a única agência do BB em Frankfurt (aquela mesma) não tem caixas para saque e não atende pessoas físicas, apenas jurídicas, de modo que eu não tinha como pegar dinheiro lá. Eu teria que ir a alguma agência de outro banco com Visa Plus, como a do Dresdner Bank, que fica ao lado. Vendo como eu estava enrolado, chegou a se oferecer para ir comigo, mas orgulhosamente agradeci e fui sozinho. Lá, após várias tentativas frustradas com cartão de crédito com Cirrus e com o cartão do BB com Plus, acabei conseguindo tirar dinheiro. Bem menos do que gostaria (há um limite, tentarei novamente amanhã), mas pelo menos já tinha muito mais do que cinco euros!

Voltei ao consulado e soube que não estão lá meus documentos. Estão em algum órgão do governo alemão, que a atendente brasileira não sabia me dizer. Terei que descobrir qual é para regularizar minha situação. Até lá, sigo como um turista a dois meses de me tornar imigrante ilegal.

Após tudo isso, passava das quatro da tarde e eu não tinha comido nada desde o pãozinho com queijo que comprei na padaria do metrô de Bockenheim às dez da manhã. Mas meus pés cansados e mente estressada mereciam uma recompensa. Encontrei perto de minha casa, aberto, um restaurante italiano, onde pude comer tortelloni à la rabiata e beber uma cerveja Warsteiner. O melhor é que perguntei se havia queijo e... ele não só trouxe um vidrinho com parmesão como também ralou pimenta no prato!

É claro que nem tudo poderia ser perfeito. Eu me empolguei, imaginando que haveria um excelente café italiano, mas ele serviu um “chafé”. A melhor solução para um café ruim é transformá-lo em café-com-leite. Pela primeira vez usei um estranho potinho com dez gramas de um creminho chamado Kafee Sahn, que eles sempre servem junto com café (acho que alemão não é muito chegado em café puro).

Fico aliviado de ter sobrevivido a mais um dia. Desta vez, sem precisar de Engov.

3 comentários:

  1. Guilherme, vou dar uma dica singela: anote o nome das ruas, os endereços, as coisas importantes numa agenda ou num simples pedaço de papel e carregue-o contigo...assim, você não se enrolará tanto!
    Dandobroncamente,
    Cattapa

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  2. Outra singela dica: Um mapa de nada adianta se você não sabe aonde quer chegar!!! ;))

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